Ter, 20/08/2019 - 00:38
São muitas as razões para termos chegado à condição difícil, talvez irrecuperável deste nordeste transmontano, em agonia prolongada há décadas, sem que alguém tenha encarado a realidade com a necessária coragem de agir para reverter o que nunca foi inevitável.
É uma longa história de indignidade dos poderes centrais, que contaram com a reverência estulta dos provincianos de cá, embasbacados com os luxos e pedrarias que lhes diziam encher a capital do reino, depois república de sendeiros, sem horizonte para além da mesquinhez pançuda, a resfolegar até à apoplexia, que a vida são dois dias e quem vier detrás que feche a porta.
Ainda por cima sobreveio meio século de um regime político que renegava o mundo que havia de chegar, fechando-se numa redoma de tristeza, com saudades de um país que, afinal, nunca existira como era contado a legiões de analfabetos.
Apesar da aparente valorização do passado, esses cinquentas anos cumpriram-se com a omissão, displicente ou deliberada, do conhecimento sólido da história do país.
Enquanto outros países realizavam avanços notáveis, com recurso à investigação histórico-arqueológica, por cá foi-se vivendo de hipóteses fantasiosas ou da pura e simples ignorância, que abria as portas ao fatalismo resignado ou ao abandono sem remorsos dos territórios e das comunidades.
Exemplo flagrante era a pretensa história de Bragança, a que se atribuíam origens nos séculos XII/XIII, porque não havia informação sobre períodos anteriores, nomeadamente da presença romana desde o século I d.C, de que se veio a ter notícia quando se realizou uma grande intervenção na cidade na transição do milénio.
Claro que não se pode ignorar o esforço e a dedicação de personalidades respeitáveis, de que é exemplo maior Francisco Manuel Alves, o Abade de Baçal que, sem suporte técnico ou científico, conseguiu realizar obra memorável, deixando claro que havia muito mais para fazer.
Mas, depois do voluntarismo e generosidade do Abade, longas décadas foram desperdiçadas, contribuindo para agravar o desenraizamento dos que saíram, mas também dos que ficaram e não puderam potenciar um património que, simplesmente, não conheciam, porque a política nacional não se empenhava em descobri-lo, muito menos em valorizá-lo.
Nas últimas décadas as coisas foram mudando. Nota-se agora vontade de promover trabalhos arqueológicos com alguma intensidade, as autarquias estão mais empenhadas e realizam-se escavações que revelam estruturas importantes para o conhecimento do passado e do património.
Para além desta conquista, valia a pena que o Estado, as autarquias e os cidadãos conjugassem esforços para valorizar a história da região, concebendo e pondo em prática rotas turísticas, com significado económico, contribuindo então para que o passado se torne num verdadeiro suporte do futuro de que não queremos abdicar.
Tendo em conta o exemplo do Côa, haveremos de reconhecer que há opções que valem a pena, mesmo quando não satisfazem o imediatismo. A persistência é a maior aliada da esperança.