Ter, 19/11/2019 - 00:43
É penoso, a raiar o ridículo, sentir a obrigação de retomar, a cada passo, um problema que devia estar resolvido há décadas, mas promete arrastar-se sem solução até que deixe de o ser, quando já ninguém tiver consciência dos seus efeitos trágicos para o país inteiro e para as gerações que lutaram para retorcer um destino que não mereceram.
Volte-se, então, ao bacalhau demolhado, expressão usada para referir discurso redondo, às voltas sobre tema consabido, sem que se pressinta rasgo para encontrar caminho até horizontes desanuviados. Uma chatice, até porque a demolha infindável do fiel amigo instala verdadeiro cheirete que nos pode levar a abominá-lo, apesar de lhe reconhecermos as delícias que secularmente nos tem proporcionado.
A viagem no tempo seria longa e dolorosa, de nos secar a alma. À velocidade da luz veremos cinco séculos de vida a escoar-se desta terra, quase sempre sem retorno, apesar dos avisos mudos dos fraguedos que velam as noites e dos sussurros nos carvalhais, que nos eriçam a pele.
Longe de veleidades poéticas, fora possível travar em tempo o desastre se houvera verticalidade e coragem política. Mas, não foi o que aconteceu e tarde está a tornar-se, cada vez mais, nunca, o que nos conduzirá ao irremediável.
Essa agora, dirão alguns, então não se vê que, pelo contrário, as medidas tomadas nos últimos três anos vão no sentido de recuperar os territórios para a partilha do desenvolvimento com o quinto do país que festeja todos os dias o progresso, esse novo bezerro de ouro com um rebrilho que entontece.
Não, definitivamente não se vê. Em 2016 foi lançada a Unidade de Missão Para a Valorização do Interior, apoiada num aparelho de propaganda inédito, mas suportada numa personalidade respeitável, competente, frontal, de uma honestidade política invulgar. Pouco mais de um ano depois Helena Freitas demitiu-se porque não teve o apoio que pensava ter. Tomou o seu lugar a segunda figura da Unidade de Missão, João Paulo Catarino, e a estrutura foi-se diluindo no esquecimento, mesmo quando se tornou secretaria de Estado, de que ele foi titular durante quase um ano, localizada em Castelo Branco, com nova festa em pleno Parlamento e palmas do presidente daquele município, que não poupou encómios.
Luís Correia, assim se chama o autarca, quis acreditar. Agora há-de estar a arregalar os olhos de espanto: afinal já não tem lá a secretaria de Estado, transferida para Bragança. Entretanto, não se lhe conhece pegada política, económica e cultural, que bem se agradecia.
A deslocação para Bragança não terá efeitos muito diferentes. A decisão foi tomada com a mesma leveza. Não se trata de uma opção estrutural, o que implicaria a transferência dos serviços e a instalação num dos edifícios que foram sobrando do abandono. Pelos vistos haverá um gabinete com três funcionários, provavelmente um condutor, um segurança e um atendedor de telefones. Isabel Ferreira terá que gerir assuntos de todo o país, mas nada impedia que os serviços ficassem centrados em Bragança.
Não se sabe se Castelo Branco manterá alguma estrutura governamental, o que nos deve pôr de sobreaviso para o resultado no fim desta festa.