Ter, 30/05/2017 - 11:00
Sexta-feira, ao entardecer, sol festeiro em Bragança, deputados em traje casual, já com ar de enfado, depois de algumas horas no distrito do extremo Nordeste, trinta léguas a deslado da urbe que voltou aos sonhos do mundo, como há quinhentos anos.
Então, ali chegavam ouro, escravos, sedas, especiarias, animais exóticos para mostrar ao Papa, propiciando um tempo de orgulhosa folia que o Tejo havia de levar nas suas águas, até ao largo oceano das profundezas e à obscuridade de séculos, uma, depois dita, apagada e vil tristeza.
Hoje, em Lisboa, depois de recentes tempos de negrume, arfa-se de entusiasmos palpitantes, sobem as rendas de até ao paroxismo, explorando um maná inesperado, fruta da sorte, resultante do fecho do Mediterrâneo, por obra e graça de novas vagas de azedume dos pregadores dos males deste mundo.
E a vida vai bela, para pasmo de quem ainda sente na carne os efeitos da leviandade arrogante, que atirou o país para o resgate financeiro quase uma década.
Discurso gasto e chato, este. Bem podíamos temperar o mau feitio e olhar com outros olhos para a luminosa capital do reino. Ainda por cima, quando deputados se dispuseram a vir, em magote, ver terras e gentes e o Primeiro-ministro desceu da noite de Bruxelas, para anunciar que o centro da Hispânia, da velha Ibéria é, nem mais nem menos, Bragança e o Nordeste transmontano, sessenta milhões de recheadas carteiras à espera que lhes demos razões para aqui se despejarem.
Ah boa... E nós, tão ceguinhos, que ainda não tínhamos percebido. Qual quê, o futuro é mesmo por aqui.
Os entusiasmos foram pífios. Talvez viesse à memória dos que por ali ouviam António Costa uma promessa de lugar no mapa do progresso, que foi minguando ao ritmo das próprias gentes, para nos trazer à dor de caminharmos para menos de cem mil almas, quase no fechar das portas do adeus.
Mas a esperança, mesmo magoada, resiste. Dali a dois dias haveria uma cimeira com os tais vizinhos, garantia do nosso futuro. Voltada para cooperação transfronteiriça, vias de comunicação incluídas.
Poderia ser que sim: a ligação por auto-estrada de Zamora a Quintanilha, a continuação do IC5 até ao território espanhol e a ligação de Bragança até Puebla de Sanabria não deixariam de estar na agenda do encontro.
Faltava a palavra que nos tranquilizasse: sim, não seriam esquecidas tão magnas questões. Mas, não, nada mais havia a dizer, depois das generalidades do discurso.
Durante o primeiro dia da tal cimeira ouviu-se falar da A25, da linha da Beira Alta e de Almaraz, essa promessa de inferno.
Da proclamada centralidade de Bragança só ficou o eco mortiço, que voltará algures no tempo, quando for simplesmente memória melancólica do que poderia ter sido, mas nunca pôde ser. Porque ficámos sempre para trás, quando se decidiu o país.
As alegrias, quando as houve, foram efémeras porque quando nos tocaram verdadeiras conquistas já nos faltava fôlego.
Assim, mais uma vez, apesar das palavras simpáticas, não temos razões para sorrir, porque faltam as obras.
Por Teófilo Vaz