O tempo da política menor

PUB.

Ter, 27/02/2018 - 11:28


Foram devastadoras as tragédias no Verão e no Outono, como nunca antes se vira neste país, com mais de uma centena de pessoas imoladas por fogos que varreram o território e deixaram um rasto de dor, destruição e desânimo.
Os sistemas de comunicações afectos às estruturas de protecção civil não deram conta do recado, a coordenação das forças de segurança não se viu, os equipamentos de combate aos fogos estariam diminuídos e, sim senhor, a florestação voltada para o mercado da celulose conduziu a um quase apocalipse. Pinheirais e eucaliptais arderam como fósforos e lançaram sobre casas e mais casas as línguas do inferno. Mas também fizeram de algumas estradas verdadeiros fornos crematórios, porque as margens não estavam limpas e as manchas contínuas daquelas espécies vegetais nunca auguraram nada de bom, apesar do verde e da frescura que iludem os riscos.
Onde a invasão de arvoredo resinoso e exótico ainda não impôs a sua presença extensiva não se conhecem fenómenos semelhantes. Assim, a decisão política imediata deveria ter passado por determinações claras e urgentes no sentido de evitar a repetição de holocaustos.
Mas, afinal, numa expressão eloquente de que em Lisboa se conhece muito mal o país e se faz política para o imediato, estabeleceu-se que até daqui a duas semanas, seja onde for, toda a gente deverá ter concluído limpezas de vegetação até 50 metros de edificações e até 100 metros à volta dos aglomerados populacionais.
Na nossa região, especialmente na terra fria, a cobertura vegetal é principalmente autóctone, composta por carvalhais e soutos, que são reconhecidamente resistentes ao fogo e à sua expansão descontrolada. Por isso, não se conhecem situações como as que se verificaram no centro do país.
Quando as decisões são para inglês ver, corre-se o risco de provocar mais problemas, em vez de resolver as verdadeiras ameaças para as populações. Os anúncios de punições são absurdos porque se sabe que nos territórios deste interior não é possível cumprir o que foi estabelecido de forma leviana.
Quando responsáveis autárquicos e mesmo o presidente da CIM Terras de Trás-os-Montes consideram que a medida é impraticável, não se compreende a insistência de responsáveis governamentais. Nestes territórios nem sequer há empresas suficientes e apetrechadas para responder num tempo tão curto, o que tornará inevitável uma vaga de coimas.
Não basta fazer leis à pressa para que o país funcione. A solução governativa actual tem gerado normas que se revelarão, mais cedo ou mais tarde, desnecessariamente fracturantes, porque resultam da urgência de popularidade ou da satisfação de grupos de pressão. Exemplo recente é a lei que permite a entrada de animais em restaurantes, cafés e similares, o que colide com as exigências que até há pouco caracterizavam a actuação da ASAE, prenunciando problemas em catadupa.
Uma certa forma de estar na vida, que caracteriza um número crescente de novíssimos urbanos, é um problema que teria solução se a política não se reduzisse ao acompanhamento das modas e fosse um exercício de coragem para conduzir o país a um futuro de dignidade.

Teófilo Vaz