A festa é sempre em Lisboa

PUB.

Ter, 11/10/2016 - 10:24


Cento e seis anos depois do golpe republicano o ex-presidente da Fundação da Casa Real de Bragança, agora eleito primeiro magistrado da nação, festejou, entre o povo, mais uma obra grandiosa na margem direita do estuário do Tejo, cartão de visita da capital desde os tempos da Torre de Belém.
A nova construção atraiu muitos milhares, que arriscaram estatelar-se sobre o comboio para o Estoril, enquanto esperavam, amontoados num passadiço, pela almejada glória de ir à estreia do MAAT (Museu de Arte, Arquitectura e Tecnologia). As “selfies” devem ter atingido grandezas esmagadoras, torrentes vertiginosas, olímpicas cascatas nos murais do facebook.
O MAAT é obra da Fundação EDP e terá custado cerca de 20 milhões de euros, com arquitecta inglesa a dar o seu contributo para o prestígio universal deste país que, curiosamente, tem passado longo tempo da sua história sob o olhar vigilante da Grã-Bretanha.
Parte significativa da energia que a EDP nos vende é produzida pelas barragens da bacia do Douro, com o território do distrito a garantir cinco dessas estruturas, das quais não conhecemos compensações úteis, de modo a olharmos para o futuro com olhos rasos da água do optimismo.
Mais uma vez ficámos com o sabor amargo da injustiça, porque as contrapartidas afinal calham a quem já dispõe de quase tudo. Claro que é o país que tira proveito de obras daquela importância, o turismo crescerá, Lisboa será ainda mais afamada, mas a fonte da energia, o esconso nordeste transmontano, continuará abandonado à sua má sorte, sem promessas de festa para o que falta de todo o sempre.
Muitas vezes temos ouvido que também depende de nós inverter o rumo, que precisamos de aproveitar os recursos, de fazer apostas que nos trarão melhores dias. Descobertas oportunidades somos sempre relegados para os bancos do fundo, no leilão em que já não podemos com os lances dos instalados barões, apoiados pelo rumor crescente das turbas que vivem do pão e vinho de cada dia, sem outros desígnios além da mediocridade, até que o tempo os remeta para o pó da insignificância, apesar de terem rodopiado, ofegantes, em volta da felicidade virtual.
A festa de Lisboa não se ficou pelo presente da EDP. O entusiasmo cresceu ainda, com a indicação de António Guterres para Secretário Geral da ONU, com aclamação para o engenheiro que, em tempos, garantiu pôr Bragança no mapa, profecia que ainda não vimos concretizada.
Um frémito deixou o país vibrante, um quase clangor patriótico encheu as redes sociais. Até se encontraram Miguéis de Vasconcelos, vendidos à tia Merkel, para defenestrar, janelas houvesse, com eles ali à mão. No entanto, ninguém aponta os que renegaram a essência genesíaca do país e as gerações primordiais que abriram nove séculos de história.
Guterres é um dos exemplos de dignidade que restam. Terá, concerteza, consciência de que o esperam dias de dedicação ao próximo, como os seus princípios lhe impõem. Como o Atlas mitológico vai carregar o mundo às costas e na consciência. Deixemos o desejo de que resista como o titã e possa entregar-nos um mundo melhor do que o que vivemos hoje.
Quanto a nós, damos de barato o MAAT em Lisboa. Esperemos que as medidas que a Unidade de Missão para o Desenvolvimento do Interior levará, depois de amanhã, ao Conselho de Ministros não se tenham espelhado nas contrapartidas da EDP para o nordeste transmontano.

Por Teófilo Vaz