Qua, 02/11/2016 - 09:54
Pregar no deserto foi sorte que acompanhou profetas, nesta nossa civilização, longos milénios hesitante entre semear a solidariedade ou, pelo contrário, manter a selva predatória, sempre com renovadas ameaças, a ressurgir do sangue derramado na disputa de míseras migalhas do tempo.
Dificilmente haverá espectáculo mais penoso do que presenciar dois miseráveis a esgadanharem-se por uma côdea bolorenta, que pode matar quem lhe ferrar os dentes.
Visionários, alguns profetas foram desprezados, objecto de chacotas seculares, até que os tempos lhes deram razão. Mas, então, já nada havia que pudesse aconchegar arrependimentos, condenando comunidades, povos e nações ao verdadeiro nada.
Na tradição democrática europeia, os órgãos de comunicação social, sem presunção de profetizar, partilham a responsabilidade cívica de contribuir para trazer à praça pública as grandes questões que se colocam no exercício da cidadania. Por isso, o jornalismo nacional nos legou contributos de reflexão e propostas ponderosas de condução dos destinos nacionais e regionais, ao longo de décadas, mesmo quando poderes anti democráticos se instalaram sobre a generalizada demissão dos portugueses.
No entanto, tais contributos raramente foram tidos em conta pelos responsáveis políticos, muitas vezes com consequências nefastas para gerações sucessivas.
A lucidez e a serenidade também não têm encontrado terreno fértil entre os protagonistas da região, apesar de repetidos apelos para a identificação de opções comuns, de objectivos profícuos para todos os concelhos, em vez de insanas divisões.
Continuamos a ver aprofundar clivagens, a propósito de actividades fundamentais para a economia regional. Não podemos, assim, disfarçar o espanto por sentirmos que não há forma de que se aprenda a lição.
Nos últimos quinze dias realizaram-se dois certames relacionados com a castanha, o produto mais notável da Terra Fria transmontana. Depois de grande festa em Vinhais, o presidente do município de Bragança veio proclamar que o seu concelho reivindica tornar-se a capital da castanha, o que foi entendido como o retomar de uma guerra sem sentido, depois do que aconteceu com a instalação de dois matadouros, que mutuamente se inviabilizam e de escaramuças a pretexto dos recordes do Guiness, o maior assador do mundo versus o maior pote do universo.
O certame de Bragança, designado Norcaça, Norpesca & Norcastanha, já é, também ele, o resultado de outras guerras fratricidas, que condenaram à morte uma feira regional de caça, depois do município de Macedo de Cavaleiros ter marchado, entusiasticamente, contra os encontros venatórios em Bragança, pulverizando iniciativas no tempo e no espaço, com resultados que as reduziram à quase insignificância.
Apesar de ouvidos moucos, as palavras não são necessariamente loucas. A região está num estado de debilidade que não permite, se quisermos sobreviver, alimentar disputas. Não há mais tempo para feiras de vaidades. Encontrem formas de cooperar para que todos os nordestinos possam conhecer dias de serenidade, mesmo de esperança, em vez de nos empurrarem alegremente para as novas arenas, onde se celebra o silenciamento dos inocentes.
Por Teófilo Vaz