Ter, 09/07/2019 - 01:29
Lá vamos outra vez para eleições. Não precisamos de nos preocupar com recepções aos candidatos, porque já passaram por cá, naturalmente à pressa, que os nossos votos não valem três por cento do eleitorado e os três deputados que ainda nos cabem não pesam, nem sim nem sopas, nas decisões do parlamento.
As expectativas relativamente às personalidades que vão liderar as candidaturas não comportam surpresas, apesar do que se tem dito sobre espectaculares rupturas que Rui Rio fará questão de levar a cabo, com consequências imprevisíveis para um partido que tem revelado capacidades inéditas de fragmentação desde os tempos da madrugada democrática.
Quanto às outras forças políticas, também teremos, certamente, mais do mesmo, o que significa candidaturas atentas, ordeiras e obrigadas às determinações dos que mandam na capital, apesar de todos sabermos que não é com posturas submissas que se garante um outro olhar dos centros de decisão politica sobre a condição a que chegaram estes territórios.
Relembrando Natália Correia, figura notável da cultura e da cidadania deste país, no século passado, apetece dizer que precisamos de nos ver representados pelo “animal que espeta os cornos no destino”, para que não aceitemos viver entre “fantasmas tão educados / que adormecemos no seu ombro”, nem nos resignemos a ser “vazios despovoados / de personagens de assombro”.
O círculo eleitoral de Bragança tem servido, desde 1975, para impor ao distrito soluções políticas que não têm em conta os verdadeiros problemas das gentes que resistem às fatalidades anunciadas. Muitas vezes as candidaturas, impostas ostensivamente pelas cúpulas partidárias, serviram para menorizar a nossa gente, tornando claro quem mandava e quem devia obedecer, bico calado e olhar rasteiro, que lugarzinhos tranquilos, mesmo menores, dão sempre jeito e podem ser antecâmaras de gabinetes mais altos, porque Deus ajuda os pacientes, o mundo dá muitas voltas e quem está ao lume certamente não terá frio.
Não foi sempre assim. Em quarenta e cinco anos houve dois ou três deputados que lograram, mesmo que tarde, fazer valer pretensões regionais e promover a sua concretização. Dir-se-á que não sentimos a desejada inversão da tendência do despovoamento, da fragilização do tecido económico, da rarefacção das estruturas de saúde, da desactivação dos meios de transporte e, portanto, de pouco serviram os respeitáveis esforços.
PSD e PS dividirão, como é habitual, os três deputados. Os que forem eleitos terão a última oportunidade de, frontalmente e com coragem, propor compromissos firmes ao poder central ou de assumir as rupturas necessárias, para poderem continuar a vida, de consciência tranquila, junto dos seus concidadãos.
Doutro modo, ficarão para a história como os “gatos pingados” do acto em que nos destinaram “um esquife feito de ferro / com embutidos de diamante / para organizar já o enterro do nosso corpo mais adiante”, como dizia Natália.
A memória que ficar depende deles, mas também de nós, da nossa cidadania, ou da falta dela.
(Citações de excertos do poema de Natália Correia “Queixa das almas jovens censuradas”.)
Teófilo Vaz