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A caminho do Inverno perpétuo

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Ter, 05/11/2019 - 02:40


Os dias vão de chuva, bem precisa era, que a água estará a tornar-se preciosidade capaz de fazer correr sangue nesta Europa do sul, adoradora do sol que a há-de secar, dizem alguns visionários sobre próximos futuros. Mas também há quem diga que um dia destes haverá gente a rezar para que não chova, que a invernia mexe-nos com os ossos velhos e acinzenta-nos a alma.
A condição dos ossos velhos já não poderá ser revertida, porque o tempo é impiedoso na sua passagem pelas vidas, se não se contrariar a propensão erosiva, que tudo reduz a pó, mesmo as expectativas, as vontades e a coragem, que não é de ferro.
Para encarar o futuro da região temos que ter em conta que os poderes centrais, durante décadas, foram culpados, por omissão, de muito do que aconteceu ao interior do país, assim como os seus serventuários locais e regionais. Mas também cada um de nós, que nos deixámos entorpecer em feiras de promessas e nos rendemos ao novo riquismo que tomou conta da capital, envaidecida no seu provincianismo papalvo, fascinada pelas megalopólis desumanizadas e envergonhada do país que lhe suporta a insustentável leviandade.
Como o futuro não surge por artes mágicas, nem se esperam milagres de deuses maiores ou menores, resta-nos o olhar frio, racional, sem ilusões, para os despojos de uma caminhada inglória de séculos de resignação fatalista.
A população continua a diminuir, de forma acentuada. Numa década podemos chegar a menos de 100 mil habitantes, a grande maioria com mais de sessenta anos. Mais dez anos determinarão nova redução drástica, cada vez mais perto do deserto demográfico.
Tivemos alívios, sem garantia de continuidade, como são as empresas do sector secundário, dedicadas a um ramo cercado de incertezas, os componentes automóveis, a que juntamos as potencialidades do Instituto Politécnico. É preciso, no entanto, ter em conta que há barbas de vizinhos a arder, como acontece na Guarda, onde uma unidade do mesmo sector viu diminuído o efectivo de trabalhadores.
A outra face da moeda seria a assunção política da promoção de condições para que os investidores no sector, adaptados às exigências da produção de veículos eléctricos, pudessem optar por permanecer e crescer na região, perspectiva que deve ser encarada com avisado pessimismo, apesar do papel que podem ter as autarquias na mobilização de empresários e na denúncia dos enviesamentos em que as decisões políticas nacionais têm sido férteis, apoiadas por verdadeiras centrais de propaganda.
Caso notável é um activo grupo no facebook, proclamado geringonça, que se multiplica em loas ao governo e que, há dias, celebrou os passes baratos em Lisboa, anunciando que tal medida tinha tirado de casa 45 mil idosos, agora com condições para passear sem preocupações. Esqueceram dezenas de milhar de idosos que continuam inamovíveis, petrificados nos espaços rurais, à espera do fim, sem estuário do Tejo, nem gaivotas, nem maresia ao preço módico de um passe social, para o qual também contribuem, sem que isso lhes passe sequer pela cabeça.
Não se vê janela de oportunidade para fugir deste Inverno.