Ter, 24/03/2020 - 12:09
Nada de novo enquanto a tempestade nos turva o horizonte. A fragilidade da condição humana, que tendemos a esquecer, faz- -se sentir em vagas alterosas de vez em quando, embora todos os dias vá mostrando que não há soberba que lhe resista, principalmente quando é filha da ignorância, capaz de ousadias despropositadas ou do simples deixar correr, até ver onde as coisas irão parar.
A agravar a desorientação que nos invade os dias, o caudal de informação não tem atingido os níveis de precisão com que gostaríamos de contar, sabendo-se que a melhor forma de controlar o medo é dispor de informação séria, racionalmente integrável, de modo a que se possa desenvolver um processo de explicação dos fenómenos, sem se cair uma e outra vez no universo das emoções, das intuições, das expectativas irracionais, afinal no jogo da sorte e do azar.
A informação deveria ser mais clara por parte das entidades governamentais, com dados objectivos sobre as condições de quem adoece, mas, principalmente, sem deixar pairar dúvidas sobre o que realmente pode ser feito ou não no que respeita a gestos do quotidiano, sem contribuir para mais alarmismo, nem para suportar voluntarismos desnecessários ou até contraproducentes, como parece estar a acontecer no caso das máscaras, que são apresentadas como fundamentais e a sua fabricação artesanal aparece como um acto de solidariedade, ao mesmo tempo que a Directora Geral da Saúde vem dizer que, pelo contrário, até poderão tornar-se um factor de agravamento da situação infecciosa.
São males de um tempo em que, havendo aparentemente informação à tonelada, muitas vezes não é fidedigna, porque não resulta da observação serena da realidade, mas circula e condiciona os comportamentos com resultados imprevisíveis
Apesar de tudo é evidente que a imensa maioria dos cidadãos está a tentar manter comportamentos tidos por adequados. Naturalmente, continuará a haver, como sempre, meia-dúzia de alimárias a provocar riscos desnecessários. Esperemos que as autoridades disponham de condições para garantir a tranquilidade possível.
No meio disto tudo há um fenómeno interessante, que se foi constatando à medida que as intervenções nos canais de televisão se foram fazendo a partir das casas de cada um, comentadores, cientistas, economistas, políticos, jornalistas e tantos outros.
O cenário mais utilizado para as sessões de Skype foram estantes com livros. Recheadas, coloridas, a dar à madeira ou brancas como é vulgar nos produtos fornecidos por grandes superfícies para serem montadas pelo consumidor, parece que muitos dos reconhecidos com capacidade de análise, de prospectiva, de reflexão querem demonstrar que a principal fonte de informação estrutural, que pode enquadrar os fenómenos com alguma solidez é o conhecimento construído ao longo de milénios, disponível sem se fazer rogado e sempre com revelações insuspeitadas a cada releitura.
Talvez o exemplo sirva para que, no futuro, clicando ou folheando, reconheçamos a importância dessa memória fundamental da humanidade.
Teófilo Vaz