O povo unido

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Boas tardes, minhas gentes. Já aqui fui relatando as teias desta história. Os chineses não sabiam o que isto era e quando fecharam as portas já o bicho se tinha escapado. No entanto, os europeus também estiveram a asistir sentados durante mais de um mês e pouco ou nada se precaveram quando ele bateu à porta desse lado. Mas agora não tem qualquer interesse andar a remoer estas coisas, porque a questão é agir e procurar respostas para o imediato. É um problema público. Não interessa a dimensão, mas sim que é algo que tem de ser resolvido com a participação de todos nós, sem falta. Como tal, é importante seguir-se de forma comprometida o que as autoridades recomendam. As instituições e os meios de comunicação, como este distinto jornal, têm o dever de cumprir este papel junto das comunidades a quem chegam. Algumas pessoas, especificamente, também têm uma importância enorme na forma como se passa a mensagem. Por exemplo, pessoas como o Tio João que tem uma grande responsabilidade em manter as pessoas que o ouvem a par do que têm a fazer, sobretudo as que estão mais desatentas e menos cientes do que realmente estamos a atravessar. Eu sei que muita gente já passou por muita coisa e eventualmente até por coisas bem piores do que isto, mas isso não é desculpa para não se precaverem e protegerem a vossa saúde. Todas as pessoas nas vilas e aldeias com maior responsabilidade social devem também ter esta preocupação porque, posso-vos dizer que, às vezes, os problemas passam na televisão, nos jornais e nas rádios até à exaustão, mas isso pouco chega às pessoas. A avaliar pelo número de vezes que, a esta distância, liguei o computador ou telemóvel e vi notícias sobre o coronavírus nos meios de comunicação portugueses, a informação que saltava, os inúmeros debates, as incontáveis opiniões, inclusive relatos de quem cá estava, todo esse barulho junto de pouco serviu. E no entanto, nem medidas foram tomadas, nem as pessoas sabiam patavina. Por isso é que volto a sublinhar, é importante neste momento que as pessoas que agora estão mais informadas façam este trabalho de grande importância social. Não é o fim do mundo, mas também não é nenhuma brincadeira. Sigam as medidas, tomem precauções, evitem aglomerados, reduzam saídas, se possível neste período evitem a interação com pessoas externas ao vosso grupo social, limpem com maior regularidade e tenham especial atenção a superfícies manuseadas por muitas pessoas (portas, corrimãos, puxadores). Redobrar a lavagem das mãos, ao entrar em casa lavar as mãos antes de tocar em alguma coisa, todos os cuidados são poucos. Evitar também levar as mãos à cara. O vírus não passará se toda a gente fizer o seu. O povo transmontano tem uma característica que é sem dúvida uma vantagem nesta batalha. A sua tradição de sentido comunitário, os hábitos de proximidade, a entreajuda dos mais novos para com os mais velhos, a atenção dos que têm mais energia para quem não tem tanta. Todos esses valores que toda a gente diz escassearem nos dias hoje mas que se fazem sentir a nordeste. O transmontano não está tão destreinado nestas coisas como outros, pelo que agora é o momento para se reforçarem estas práticas. Mas, atenção, que a resiliência transmontana não sirva para encher o peito de ar nem desvalorizar esta pandemia. É altura de pôr mãos à obra com muitos caldos de galinha. Se cada um de nós proteger a sua própria saúde já está a prestar um enorme serviço para a comunidade. Na verdade é o único contributo que se nos pede. Uma conduta individual que contribui diretamente para o bem de todos. Poucas acções individuais têm um efeito mais imediato e visível, mas também mais social e global do que esta. Com cada um fazendo o seu, levando a vida normal, sem dramas que nada ajudam, este bicho não vai ter para onde ir. Há uma parte boa nesta história. Há um lado bom e poderoso na história dos dias negros. O lado em que dependemos mais do que nunca uns dos outros, o lado em que temos de caminhar juntos a compasso, o lado em que o povo transmontano observa para todas as cicatrizes que traz na pele enquanto um sorriso se lhe escapa pelo canto da boca, o lado em que as gerações mais novas podem sentir uma amostra dos apertos pelos quais os pais e avós foram conseguindo escapar. E sentir de como sair desses dias negros tornam outros problemas mais pequenos, mais fúteis. Este vírus vai ter o mérito de nos fazer ver o lado bom dos dias maus. Os colectivos dias maus para quem deles já estava pouco lembrado ou para quem os mesmos não passaram de histórias contadas por outros. O povo trasmontano unido diz sempre presente a todas as pedras no caminho, a todas as batalhas a precisar de ser vencidas. Desta vez não vai ser diferente. Estamos unidos. Um abraço!

* Leitor de Português na Universidade de Sun Yat-sen, Cantão Guangdong – China

Manuel João Pires