LAY-OFF simplificado (I)

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O regime denominado lay-off simplificado tem na sua génese, num primeiro momento, a qualificação pela OMS (Organização Mundial Saúde), no dia 11/03/2020, como uma pandemia internacional a emergência de saúde ocasionada pela doença COVID-19, que rapidamente alastrou e evoluiu em todo o mundo e em particular na União Europeia, num segundo momento, a declaração pelo Presidente da República do estado de emergência (Decreto do Presidente da República n.º 14-A/2020, de 18/03), com fundamento na verificação de uma situação de calamidade pública e, num terceiro momento e como causa próxima, a regulamentação pelo Governo da declaração do estado de emergência através do Decreto n.º 2-A/2020, de 20/03, consagrando medidas com vista a prevenir a doença, conter a pandemia, salvar vidas e assegurar que as cadeias de abastecimento fundamentais de bens e serviços essenciais continuassem a ser asseguradas. 
Decreto n.º 2-A/2020, de 20/03 que para além de estatuir o confinamento obrigatório (em estabelecimentos de saúde ou no respetivo domicílio) dos doentes com COVID-19, dos infetados com SARS-Cov2 e dos cidadãos relativamente a quem a autoridade de saúde ou outros profissionais de saúde tenham determinado vigilância ativa (constituindo a violação de tal obrigação crime de desobediência), um dever especial de proteção para os maiores de 70 anos, os imunodeprimidos e os portadores de doença crónica (em especial hipertensos, diabéticos, doentes cardiovasculares, doentes oncológicos e portadores de doença respiratória crónica), um dever geral de recolhimento domiciliário para a generalidade dos cidadãos e o teletrabalho como regime a adotar sempre que as funções exercidas o permitam, ordena o encerramento de instalações e estabelecimentos empresariais e a suspensão da generalidade das atividades no âmbito do comércio a retalho e da prestação de serviços.
Imposições legais que, necessariamente, determinam, por um lado, a drástica redução da procura em geral, a impossibilidade total para as empresas de gerar rendimento e, consequentemente, de suportar os custos fixos inerentes ao exercício da sua atividade (mormente e para o que aqui interessa, os de natureza salarial) ou ainda, para aquelas empresas que a puderam continuar a exercer, a insuficiência do rendimento obtido para integralmente os poderem satisfazer, sendo inexoravelmente colocadas, por força de lei, em situação de crise empresarial. 
E é neste enquadramento que para mitigar as situações de crise empresarial geradas e apoiar a manutenção dos postos de trabalho (que para a generalidade das empresas constituiu o principal custo de atividade) que o Governo adota um conjunto específico de medidas que representou no Decreto-Lei n.º 10-G/2020, de 26/03 e que passou a ser conhecido pelo regime do lay-off simplificado.
Regime que se traduz na possibilidade que as empresas têm de lançar mão das figuras da redução temporária do período normal de trabalho ou da suspensão do contrato de trabalho por facto respeitante ao empregador em situação de crise empresarial e que já se encontrava consagrado no Código do Trabalho aprovado pelo Decreto-Lei n.º 7/2009, de 12/02 (com as alterações que lhe são subsequentes), designadamente nos seus artigos 298.º e seguintes, vulgarmente conhecido por lay-off.
O que de novo, na sua essência, para além do mais e sem excluir a possibilidade que as empresas têm de continuar a poder recorrer ao regime geral estatuído no Código do Trabalho (que também nos será útil para a interpretação do regime ora instituído e para suprir as suas lacunas), agora se prevê é a agilização do procedimento que no Código do Trabalho tem uma tramitação mais pesada, complexa e morosa e daí a designação de lay-off simplificado, que seguidamente, a traço grosso, se abordará. 
O princípio informador e determinante da sua consagração legal é a manutenção dos postos ou contratos de trabalho.
Os, cumulativos, pressupostos da sua aplicabilidade são verificar-se uma objetiva situação de crise empresarial, nos termos em que é definida no diploma legal e a que infra se alude, e pretender o empregador reduzir temporariamente o período normal de trabalho de um, alguns ou todos os seus trabalhadores ou pretender suspender o contrato de trabalho de um, alguns ou todos os seus trabalhadores, podendo socorrer-se de forma conjugada das duas opções (redução do período normal de trabalho e suspensão de contratos de trabalho).
O regime aplica-se a empregadores do setor privado (sociedades comerciais, cooperativas, associações, trabalhadores independentes/empresários em nome individual que sejam entidades empregadoras), incluindo as entidades empregadoras do setor social (IPSS) e aos trabalhadores ao seu serviço, afetados pela pandemia da COVID-19 e que se encontrem, em consequência, em situação de crise empresarial.
Considera-se situação de crise empresarial:
- O encerramento total ou parcial da empresa ou estabelecimento, decorrente do dever de encerramento de instalações e estabelecimentos previsto no referido Decreto n.º 2-A/2020, de 20/03 ou por determinação legislativa ou administrativa, nos termos previstos no Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13/03, na sua redação atual, ou ao abrigo da Lei de Bases da Proteção Civil, aprovada pela Lei n.º 27/2006, de 03/07, na sua redação atual, assim como da Lei de Bases da Saúde, aprovada pela Lei n.º 95/2019, de 04/09, relativamente ao estabelecimento ou empresa efetivamente encerrados e abrangendo os trabalhadores a estes diretamente afetos;
- A paragem total ou parcial da atividade da empresa ou estabelecimento que resulte da interrupção das cadeias de abastecimento globais ou da suspensão ou cancelamento de encomendas;
- A quebra abrupta e acentuada de, pelo menos, 40 % da faturação no período de trinta dias anterior ao do pedido junto dos serviços competentes da segurança social, com referência à média mensal dos dois meses anteriores a esse período, ou face ao período homólogo do ano anterior ou, ainda, para quem tenha iniciado a atividade há menos de 12 meses, à média desse período.
Duas notas aqui importa registar. Por um lado, que, no primeiro caso, ao encerramento total ou parcial da atividade da empresa ou estabelecimento por determinação legal é equiparável o encerramento de empresa ou estabelecimento do comércio a retalho ou da prestação de serviços que, por força de lei, viram as inerentes atividades suspensas (e como tal impedidas de prosseguir a sua atividade) e, por outro lado, que, nos dois últimas casos, exista a correspondente documentação de suporte (comercial, contabilística) e sejam confirmados pelo contabilista certificado da empresa ou entidade empregadora.
O empregador que se encontre em situação de crise empresarial, ao abrigo de qualquer uma das causas anteriormente especificadas, tem direito a:
- Apoio extraordinário à manutenção de contrato de trabalho, devendo para tanto comunicar, por escrito (carta, e-mail, notificação pessoal ou outro meio idóneo de comprovação), aos trabalhadores visados a respetiva decisão, indicando a duração previsível e ouvidos os delegados sindicais e comissões de trabalhadores, quando existam;
- Incentivo financeiro extraordinário para apoio à normalização da atividade da empresa;
- Isenção temporária do pagamento de contribuições para a Segurança Social, a cargo da entidade empregadora;
- Plano extraordinário de formação.
Pela sua maior relevância circunscrever-se-á a atenção às três primeiras medidas.
Assim, o apoio extraordinário à manutenção de contrato de trabalho, é um apoio exclusivamente destinado ao pagamento de remunerações e traduz-se:
- No caso de suspensão do contrato de trabalho, na redução em 1/3 da retribuição normal ilíquida mensal do trabalhador (compreendendo a sua remuneração base e incluindo, se for o caso, as diuturnidades e ainda todas as prestações inerentes à concreta execução do seu trabalho, designadamente e entre outras, o subsídio de turno, o subsídio de isenção de horário de trabalho, mas excluindo o subsídio de alimentação), passando assim o trabalhador a ter direito a auferir 2/3 dessa sua retribuição normal ilíquida, que nunca pode situar-se em valor inferior à RMMG (remuneração mínima mensal garantida, atualmente no valor de 635€), sendo quando inferior reconduzível a tal valor (635€), nem superior ao valor correspondente a três RMMG (1.905€). Do valor assim apurado 30% é suportado pelo empregador e 70% pelo serviço público competente da área da segurança social. Obviamente que nada impede que o empregador, se assim o entender, possa a expensas suas remunerar os trabalhadores acima de tais limites ou em conformidade com as remunerações que os seus trabalhadores efetivamente auferiam, porém, a segurança social circunscreverá sempre a sua comparticipação a tais limites. 

Henrique Caldeireiro