A LAMA E O PÂNTANO

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Não se drena um pântano jogando lama para dentro das águas. Obviamente que o nível da água podre subirá e, transbordando, diminuirá o seu volume no recipiente pantanoso… mas, ao ser substituída por lodo não acrescenta vitalidade e renovação, antes pelo contrário, continuará a alimentar a fauna e flora que habita as regiões de solo apodrecido. Provavelmente haverá, inclusive, um reforço dos habitantes, animais e vegetais do atoleiro. Por isso, quando o cheiro a apodrecimento começar a incomodar os habitantes das redondezas a solução não passa pelo acréscimo de material putrefacto, mas pela sua substituição por rochas, terra boa, plantas sadias e extração dos líquidos fedorentos. De pouco adiantará, inclusive, fazer um muro a meio, para separar zonas se, na zona a que temos acesso e que confina com terra arável, depositarmos algo muito parecido ao que há do outro lado e, para piorar, garantindo a estanqueidade da parede… fazemos buracos a meia altura, distantes da vista geral que… para grande espanto, o seu bloqueio vem do lado errado. No Expresso da Meia-Noite o inefável e arrogante líder parlamentar do PSD, Hugo Soares veio “revelar” que terá negociado com o Chega não só a eleição para a presidência da assembleia da república, como ainda para a redução do IRS e para a abolição das portagens! Se isto é um cordão sanitário, se este é o entendimento de “não, é não”, vou ali e já venho. Para acrescer à “refundação” apregoada durante a campanha eleitoral e ao início do novo ciclo de transparência e cumprimento de todas as promessas eleitorais… começam a surgir no horizonte sinais deveras preocupantes. O superavit, reconhecido e certificado pelo ministério das finanças na véspera da “enorme” descida de impostos convertia-se em déficit num ápice, num passe de magia, num truque de ilusionismo! Que, extraordinariamente, não impede a demagógica e eleitoralista medida de abaixamento do IRS mas começa a ser um obstáculo à concretização prática da miríade de benesses tão claramente propaladas em campanha eleitoral e agora, tão maquiavelicamente revisitadas na altura das negociações, como parece estar a acontecer com os subsídios de risco das forças de segurança, a recuperação do tempo dos professores e a valorização das carreiras públicas dos enfermeiros, médicos e oficiais de justiça! Veremos. Porém do que já não há dúvida, diga o primeiro ministro o que quiser e entender é a grande ânsia de afastar, sem apelo nem agravo, sem contemplação nem respeito e consideração (que deve presidir, sempre, ao exercício do poder) quadros competentes, pessoas dedicadas e honestas, gestores e técnicos, antes de terminarem as comissões de serviço para que foram investidos legal e legitimamente. Instituições com notórias dificuldades não melhoram, por qualquer passe de magia, só por verem substituídas as suas lideranças. Dirá o bom senso que, substituições apressadas e sem o devido tempo de transição (se e quando justificável) irão sofrer e ninguém garante quanto tempo levará a sarar as feridas abertas com estas operações “de emergência”. O próprio Governo já se terá apercebido da “asneira” em afastar Fernando Araújo ao anunciar publicamente que a melhor alternativa ao projeto que o Diretor Executivo do SNS personalizava era… pasme-se… o projeto a elaborar pelo mesmo para ser executado por outrem! Obviamente que, para salvar a face, a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa terá de apresentar, no imediato, resultados claramente positivos para justificar a inqualificável exoneração de Ana Jorge com caráter de inusitada urgência!

José Mário Leite