Estação maluca

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Maluca se designa a estação estival porque asneiras estripadas, atitudes insólitas, acções estúpidas, enfim, todo aquilo que nos fere a sensibilidade, nos vai moendo, devagar, devagarinho, o juízo, levando-nos a súbitas manifestações de mau humor, quando não a iracundos esbracejamentos a provocarem surpresa a quem nos conhece, com quem convivemos. Os antigos diziam serem os efeitos do imenso calor, serem zoeiradas a passarem mal chegavam os ventos vindos da festa em honra de Nossa Senhora dos Remédios de Tuizelo.
Esses mesmos antigos mediam o tempo de acordo com o calendário litúrgico, soletravam datas de festas, feiras, trovoadas e demais ressonâncias estrídulas em função da sua própria vida numa cadência provinda dessa enorme conquista que foi a contagem do tempo expressa na Torre sineira, ali o sino de voz varonil fazia-se em ouvir nas redondezas alertando os atrasados, os dorminhocos, os relapsos ao aforismo – deitar cedo e cedo erguer dá saúde e faz crescer –, agora crescemos a caminho da finitude carregando equipamentos de guia dos nossos passos obrigando-nos a lastimar o tempo perdido (leiam o Proust), a fungar pingos do nariz por não termos prestado mais e melhor atenção às nossas avós na altura de elas recordarem os moços de cegos, autênticos alfobres de novidades.
Agora, as novidades atropelam-se nos telemóveis, nefandas algumas, chamo a atenção para a excelente reportagem da TVI relativa à valsa lenta de horrores perpetrados contra doentes e idosos na Santa Casa da Misericórdia de Ponta Delgada, sucedendo o mesmo na de Angra do Heroísmo, ver e ouvir os miolos daquele rosário de infâmias provocou-me a mesma repulsa sentida ante a contemplação de sinistras memórias do holocausto, levando-me à interrogação: como é possível? E, interrogo-me ante a passividade do governo regional. O secretário de Estado regional já devia estar demitido, os irmãos (com minúscula) evidenciam execrável comodismo pois não consta terem suspendido os Provedores, e ordenado rápido e honesto inquérito aos acontecimentos denunciados nas referidas reportagens. Só na estação maluca? Claro que não, porém como a TVI decidiu (e bem) avinagrar a quentura dos dias, conviria dedicarmos algum tempo à análise das nossas instituições de todo o género, principiando por elencar as existentes, visitá-las fazer perguntas, pedir relatórios de contas e avaliações, fazê-lo é um dever de cidadania, mais a mais estas Organizações recebem e gastam dinheiros vindos do Orçamento de Estado.
Por mais de uma vez saliento a acuidade dos editoriais de Teófilo Vaz, pois bem, o estarmos no auge da estação da toleima, leva-me a pedir-lhe o favor de recapitular os grandes temas/problemas a atrofiarem o Nordeste, associando-lhe os esforços e tomadas de posição dos deputados na resolução dos mesmos. Eu sei da quase nula eficácia do detergente – requerimentos –, por isso interessa-me conhecer outras diligências e efeitos no decorrer da temporada de trabalho agora finda dos nossos honoráveis.
A degradação do transporte ferroviário é chocante, clamorosa, digna de chamada de atenção do Senhor Presidente Marcelo. Bem sei, outro tema louco é o golpe de Tancos e o Presidente não tem logrado grande esclarecimento, no entanto, os comboios gastam muitos dias em férias (greves), os défices são do tamanho dos Himalaias, os passageiros pagam passes e bilhetes, viajam quando viajam numa clara cópia do velho trem “lhega, quando lhega”, devemo-nos envergonhar, não por acaso somos anfitriões da Senhora que cantou a populista Evita, possui uma frota de quinze carros (Ronaldo possui mais penso desprovido de malícia), e já terá visitado o vizinho, o Museu de Arte Antiga, todavia não consta ter deixado um cheque ao Dr. Pimentel.
Eu gosto de visitar e estudar Museus, a escritora Natália Nunes escreveu Assembleia de Mulheres, acídulo romance polvilhado de mulheres (muito antes da guerra das quotas), sempre que leio novas e velhas fórmulas de massa levedar no Museu Abade de Baçal, recordo a Dra. Maria de Lourdes Bártolo, ela tinha classe, autora de textos bem escritos (possuo alguns) de doutrina museológica e adorava antecipar-se aos acontecimentos. 
Caríssimos leitores: num tempo de alta volubilidade das notícias, hei-de escrever relativamente às falsas, duvidei do interesse dada a rusticidade cómica do tema – a estéril natalidade – porque se fazer meninos no feitio só o Jeco se obriga a esforços, brotá-los é dolorosa incumbência da Jeca, criá-los é constante obrigação dos dois, este somatório leva à rarefacção daí a astúcia da Senhora Merkel, a receita está testada desde sempre, as moleirinhas sabem-no, falar em vez de fazer ultrapassa a sazão calorenta. Os comentaristas fingem não saber! O fingimento é extensivo às restantes matérias desta crónica escrita à beira-mar. Nas proximidades veraneiam vários comentaristas. Daí o contágio. Desculpem!

Armando Fernandes