A costeleta (o PCP e os CTT)

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Imagine-se que alguém, tendo comprado num talho, dois ou três quilos de costeletas, regressa algum tempo depois a devolver os ossos, por serem duros demais. Obviamente que o talhante, se for educado, explicar-lhe-á que quando optou por aquele tipo de carne, em vez de bife da alcatra, sabia bem que o osso estava incluído e por essa razão o preço era mais baixo. Se estiver mal disposto, com pouca paciência ou se o reclamante for reincidente e agressivo, o mais provável é que seja corrido do talho, à frente de cutelo ameaçador! É esta, mutatis mutandis a resposta que se espera do Governo da Nação face à intenção da Administração dos CTT de fechar dezenas de postos de atendimento ao público. Contrariamente ao exemplo referido, aqui há uma terceira opção. Não podendo o dono do talho pedir a devolução do produto transacionado, o Estado pode reverter a privatização da empresa de distribuição de correio e encomendas.

Tal como o cliente do açougue, quem adquiriu as ações dos CTT, fê-lo na mira do uso da licença bancária, associada ao negócio, sabendo que a contrapartida era a garantia de assegurar o serviço público de correio e demais serviços postais em todo o território nacional independentemente da rentabilidade local. E é isso que têm de ser obrigados a manter. Mesmo que tal resulte em prejuízo. É essa lei do Mercado e esse o princípio que os empresários exibem quando lhes convém! Não se pode ignorar que, em causa está uma atividade imprescindível para uma larga faixa de portugueses, com anormes carências e fragilidades e que é necessário assegurar. Se o concessionário não o faz então que o volte a fazer o Estado que não se pode nunca assumir-se como um grande conglomerado mercantil nem basear a sua atividade na rentabilidade e no lucro.

Obviamente que a administração pública, sendo uma entidade de bem, deve comportar-se como tal. Deve cumprir os acordos que estabelece mas não pode negligenciar as contrapartidas negociadas. Os CTT estão numa senda de que já ninguém pode alegar ignorância, quanto ao destino final. Uma após outra, vai fechar TODAS as delegações onde não tenha assegurado rendimento adequado. Veja-se o que se passou, só este ano. Em janeiro anunciou o encerramento de 22 lojas e, antes de dezembro, a intenção clara e assumida, ultrapassa já largamente a meia centena. Com uma estratégia vil, cobarde e sorrateira, vai comunicando uma hoje, outra amanhã, esta no norte, a seguinte no sul, de forma a minimizar o impacto e a fazer passar suavemente o brutal golpe que pretende desferir no interesse e utilidade pública a que contratualmente se comprometeu.

Contrariamente ao que pretende fazer crer e que, de certa forma está a conseguir, a luta e a resistência contra tão ínvio intento não é uma contenda local ou sequer regional. Não é um problema de Arraiolos, Calheta, Izeda ou Vila Flor. Nem tão pouco do distrito de Évora, da CIM transmontana ou até da região autónoma da Madeira. Nem sequer uma questão partidária nem do governo ou da oposição. Este é um problema nacional e resposta adequada ao traiçoeiro e  pérfido ataque ao interesse público tem de ser de toda a população, multipartidária e situar-se muito para lá da ideologia. No meu entender, a melhor forma de o demonstrar, é assumir que não é necessário aderir a um qualquer partido nem subscrever a sua ideologia para abraçar posições claras e justas que este possa defender e liderar. Só um míope ou um cego é que não vê que, nesta situação concreta, quem está melhor posicionado para comandar as tropas é o PCP, não só pela coerência sempre assumida nesta matéria como ainda pela inquestionável capacidade de mobilização e congregação das razões de protesto. Não há-de ser preciso colocar um pin com a foice e o martelo, na lapela, nem sobraçar o Kapital para integrar uma significativa e inequívoca mega manifestação/protesto contra o golpe que estão a desferir nos nossos legítimos direitos.

De nada servem declarações grandiloquentes que não contribuam para o reforço desta urgente tarefa. Que ninguém seja questionado por engrossar este apoio. Se qualquer liderança partidária questionar um miltante por esta atitude, a este só resta mandar o partido às urtigas, já que a militância só tem sentido se puder ser canalizada para o interesse comum. Por mim, já tenho à mão um cachecol vermelho (que também é a cor do Benfica e dos CTT) e, de bom grado engancharei o meu braço no do Jerónimo para marchar ao seu lado a reclamar a reversão da privatização, se o serviço público não for devidamente assegurado.

José Mário Leite