Boa mesa, boas notícias

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A cidade, a nossa cidade, começa a despontar de modo rigoroso e constante no universo das artes, das ciências, da educação, da gastronomia e por isso mesmo nos guias da especialidade. Assim, acontece com o Boa Cama, Boa Mesa. Na edição deste ano, no respeitante ao Distrito de Bragança, das dezoito citações sete pertencem ao burgo do Braganção, num total de dezoito. Acresce uma distinção a do – garfo de ouro – ao jovem chefe Óscar Gonçalves à frente dos fogões da Pousada de S, Bartolomeu. Retenha-se o facto de tal distinção já lhe ter sido atribuída quando exercia o ofício no Restaurante Geadas, da família, no qual pontifica a sua Mãe, Dona Iracema, que trabalha a preceito o receituário da cozinha transmontana.
Para além dos nomeados e louvados restaurantes no referido Boa Cama, Boa Mesa, outras casas de comeres existem na cidade que não deixam os seus créditos por mãos alheias, juntando-se ainda expressões culinárias de cunho étnico e internacional para lá do fast-food, cuja causa está na vigorosa implantação do Instituo Politécnico de Bragança no mercado educacional como tivemos ocasião verificar através do documentário da SIC passado na pantalha no dia sete de Abril.
Estaremos ante um milagre? Da multiplicação dos pães? Sim, estamos ante o milagre de enorme esforço, entusiasmo e perseverança contra ventos de ciúme, tempestades de maus augúrios e raivosas invejas daquela e daqueles que durante nos escarneceram dos dois principais fazedores de milagres. Escarrapaacho os nomes: António Jorge Nunes e Hernâni Dias. Cada qual a seu modo souberam congregar vontades, concitar interesses, agregar especialistas de várias áreas do saber cuja influência, massa crítica e consequente representação está expressa em obras emblemáticas – Teatro Municipal, Centro s de Arte e de Interpretação, Museus e Memórias – que transbordaram largamente as margens do Sabor e do Fervença, obrigando públicos de várias pigmentações, aculturações variadas e de múltiplos gostos cromáticos a olharem, observarem e perscrutarem as serras, os montes, os vales, os vergéis, as searas e os soutos do concelho de modo a ficarem cansados, derreados e esfomeados e a clamarem por gasalho e pitanças. Tudo isto demorou muitos anos, muitos sorriram de mofa quando se levou a bom termo a exposição do Eixo-Atlântico e o pintor Armando Alves passou a entusiasta da cidade, a mofa aumentou ao se falar na ideia de transformação da cidade na capital gastronómica de Trás-os-Montes (estamos no bom caminho), depressa nos mofadores minguaram as queixadas abertas nas tentativas de escárnio, os resultados foram aparecendo, as marcas identitárias e consequente investimentos granjearam o interesse de investidores, investigadores, artistas, criadores de sons e tons que vão da polifonia à individualidade suscitando sonhos e desejos levados à prática.
O caminho faz-se caminhando escreveu o poeta sevilhano, na vetusta cidade de Bragança o caminho continua a fazer-se, caminho eivado de calhaus, de valas, de pedras, de abrolhos, de silvedos e outras dificuldades, desde o desvios de fundos europeus à pouca atenção da Entidade de Turismo do Porto e Norte de Portugal, passando pela cupidez do autarca Rui Moreira, apesar de tanta contrariedade os jornais de referência apontam Bragança como terra coriácea, teimosa no querer, revigorada e no caminho do continuado crescimento sustentado, empenhada no imitar as suas Mestras cozinheiras, do pouco faziam muito, das humildes ervas, dos frutos silvestres e dos saborosos malápios do Gamboa.
As indústrias da cultura geram lucros de índole económica ao fim do gasto de meses quando não de anos, os contabilistas de contas estreitas e vistas curtinhas na sua maioria não sabem o significado de aculturação escorada nos patrimónios imateriais, sabem ronronar nas assembleias até se falar de cultura. Nesse exacto momento acordam e trovejam – estamos fartos de cultura – preferimos salpicões e alheiras. Saberão eles os cuidados e os trabalhos realizados pelos nossos ancestrais para nos deliciarmos com esses enchidos, um deles é massa principal de uma lenda? Pois é, tudo tem um começo e uma história, no começo o palato saliva ao cheirar a alheira, depois saboreia-a e percebe a diferença entre a realidade e a lenda. As pessoas gostam de lendas, Bragança é uma terra de lendas sápidas e a ficarem na memória. Na memória do gosto!

Armando Fernandes