Sambade: 1 de Novembro era o dia dos magustos

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Ter, 07/11/2006 - 10:50


Havia os magustos dos mais velhos, dos que apreciavam o calor do lume acesso e os magustos dos mais novos.

Os primeiros, quase sempre à noite, no aconchego da família, na altura numerosa, e no calor dos amigos, que eram também muitos, assavam as castanhas no assador de lata, muitas vezes um aproveitamento de um caldeiro velho, gasto pela cozedura das viendas e que, por erotismo, chamavam crica.
Os mais novos, na altura em número elevado, esperavam, com ansiedade, que chegasse o dia dos fiéis defuntos para cumprirem o ritual do magusto, nos castinheiros, normalmente, depois da missa.. A aguardente, de lavar a cara aos santos, a de menor teor de álcool, e a jeropia haviam de fazer boca para que as castanhas farinhudas escorregassem melhor.
Enquanto as raparigas espalhavam as castanhas em círculo, em cima da terra humedecida pelo tempo, os rapazes procuravam a lenha, se possível seca que iam dispondo com sabedoria e engenho em cima do magusto.
Havia sempre no grupo o ancião, aquele que mais habilidade tinha para arranhar as castanhas, cobertas pelas labaredas. Os momentos altos desta confraternização era quando as castanhas, que não haviam sido abertas, rebentavam, e saíam disparadas por entre as hastes das gestas e acertavam nos que estavam mais perto.
Terminada a assadura é que a festa ganhava todo o sabor e encanto. Estes magustos eram muitas vezes pretextos para acertar contas ou para ganhar coragem para pedir namoro, em casos de maior resistência. E, então, todos se apressavam, não tanto para fazer os bilhós, mas mais para enfuliçarem as mãos para se enfarruscarem. Os rapazes perseguiam as raparigas que pretendiam namorar e, às vezes, no enfuliçar da cara, podia ser que viesse mais qualquer coisa... Momentos de glória eram aqueles em que as raparigas conseguiam enfarruscar este ou aquele, sobretudo se tinha pretensões de galaroze. Das raparigas poderia dizer-se que as mais enfuliçadas eram as mais pretendidas. Rapariga enfuliçada era rapariga cobiçada.
No meio do grupo, havia sempre os ingénuos ou iniciados, a quem os anciãos mandavam molhar uma gesta para abafar as castanhas já assadas. Quando regressavam, com a tarefa cumprida, restavam algumas folecras ou restos de castanhas mal assadas.
(De salientar que nestas festas não havia misturas de pessoas de estratos sociais diferentes. Normalmente as meninas, de estrato superior, ou aquelas que iam estudar que automaticamente subiam de estatuto, não se misturavam).
Cada grupo de jovens fazia o seu magusto com os do seu lugar. E, nesse dia, viam-se, aqui e além, nuvens de fumo leve e pacífico subir no céu pardacento, sinal de muita alegria e confraternização saudável.

Lourdes Graça Camelo Silva