Milhares nas ruas de Bragança para homenagear Giovani

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Ter, 14/01/2020 - 11:56


Foi com silêncio que a comunidade brigantina e estudantil homenageou Luís Giovani Rodrigues, o estudante cabo-verdiano de 21 anos que morreu, depois de ter sido vítima de agressões à saída de um bar em Bragança, a 21 de Dezembro.

A marcha silenciosa, que reuniu mais de 2000 pessoas, percorreu algumas ruas de Bragança entre o Instituto Politécnico e a praça da Sé onde decorreu uma vigília, também ela silenciosa. Na frente os participantes seguravam uma faixa com a mensagem principal “Não à violência”. Integravam a grande moldura humana jovens estudantes trajados ou com t- -shirts brancas com a fotografia de Giovani. A população da cidade também engrossou a marcha para mostrar pesar e solidariedade. O jovem, que estudava no pólo de Mirandela do IPB desde Outubro, morreu após 10 dias em coma, na sequência de agressões sofridas na madrugada de 21 de Dezembro, que terão sido cometidas por um grupo de 15 pessoas. Os participantes na marcha pacífica e silenciosa pediram justiça para Giovani. Jéssica Rocha estudante do IPB há 5 anos, natural da ilha de São Vicente explicou que participou na marcha “não só pelo facto de que ele era colega e cabo-verdiano”, mas também porque querem “justiça”. “Há falta de provas, não dizem nada, se já sabem quem foram os culpados, e isso aumenta a consternação”, afirmou. Empunhando um dos muitos cartazes distribuídos com a fotografia do jovem assassinado e em que se lia “Justiça. Quem matou Giovani?”, Ricénio Gomes juntou-se à homenagem porque se sensibilizou com o caso. “Colocamo-nos no lugar do jovem, podia ser qualquer um de nós e também acho que é algo fora do comum em Bragança, já estou aqui há cinco anos e nunca aconteceu nada do tipo”, afirmou. “Que a justiça seja feita”, acrescenta Márcia Santiago. Já no fim da marcha, a jovem desabafa que “cada vez se diz uma coisa, mas não se sabe ao certo o que se passou realmente”. “Queremos uma resposta. Coitada da mãe e dos familiares que mandaram o jovem para aqui à procura de um futuro melhor e recebem o filho num caixão”, afirmou. O presidente da Associação de Estudantes Africanos do IPB, Wanderley Antunes, destacou a mobilização para esta marcha. “Esperávamos por uma grande adesão, da população residente e da comunidade estudantil do IPB, a moldura humana foi a que esperávamos”, referiu. O representante dos estudantes afirmou que a consternação ainda é muita entre a comunidade estudantil. “Os ânimos ainda não estão completamente calmo porque as autoridades ainda não deram uma palavra sobre o caso e estamos à espera que os culpados paguem pelo crime bárbaro que cometeram”, afirmou. O secretário de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior e ex-presidente do Politécnico de Bragança juntou-se à homenagem. Sobrinho Teixeira referiu- -se ao caso frisando que “isto não é Bragança”, mas garante que não será esquecido. “Quero sobretudo transmitir que aquilo que se passou não será esquecido. O que vimos aqui nesta homenagem é Bragança, uma cidade multicultural”, frisou. Também o presidente da câmara de Bragança, Hernâni Dias, que se associou à iniciativa considera que o “acto isolado” não reflecte o espírito acolhedor da cidade. “Viemos prestar o nosso apoio a esta manifestação de pesar por tudo o que aconteceu, mostrando que a comunidade brigantina é pacífica e acolhedora”, sublinhou. Na praça da Sé a vigília prolongou-se em silêncio por cerca de meia hora. A palavra paz foi escrita com velas brancas, que depois foram entregues pelos escuteiros aos participantes na homenagem. A marcha seguiu daí para a Catedral de Bragança onde o Bispo da Diocese de Bragança-Miranda presidiu a uma eucaristia em memória do estudante de 21 anos. D. José Cordeiro apelou à paz e à não violência. “O que queremos dizer com esta marcha é que nunca mais a violência, nunca mais o ódio. Sim e mais fraternidade e a paz, o diálogo e a harmonia social”, disse. Para além da marcha e vigília em Bragança, houve ainda homenagens, no sábado à tarde, noutras cidades portuguesas, como Lisboa, Porto, Coimbra e Covilhã, e também em vários pontos de Cabo Verde, em Paris, Londres e no Luxemburgo. Um grupo de estudantes cabo-verdianos que organizou uma destas homenagens pelo país justificou modelo silencioso da marcha sublinhando que Giovani “foi violentado em silêncio, ficou em coma em silêncio e morreu em silêncio, face a uma indiferença silenciosa”. “Não há palavras que consigam expressar a nossa indignação neste momento”, por isso o silêncio foi o mote da forma de protesto, solidariedade e de apelo à justiça por Giovani. O corpo do jovem já foi trasladado para a ilha do Fogo. O funeral está marcado para sábado, dia 18, em Mosteiros, de onde era natural.

Vereadores pedem reforço de segurança

Na última reunião de câmara municipal de Bragança, os vereadores eleitos pelo PS, Graça Patrício e Nuno Moreno pediram um reforço da segurança. Dizem acreditar também tratar-se de um “facto isolado e excepcional”, mas consideram que não se deve subestimar o que aconteceu. Pedem que se “implementem medidas de polícia de reforço e acompanhamento de proximidade, em determinados locais “mais problemáticos” de Bragança. Sugerem que se “equacione a colocação de câmaras de videovigilância”, que se convoque o Conselho Municipal de Segurança e que se criem mecanismos de comunicação com a população para transmitir e esclarecer este tipo de casos, ainda que pontuais. 

PSP garante que investigou caso “desde o primeiro momento”

A Polícia de Segurança Pública (PSP) falou pela primeira vez sobre este caso, em comunicado da direcção nacional. A força de segurança explicou o sucedido na madrugada do dia 21 e garantiu que “desenvolveu as diligências necessárias, para a investigação dos factos e respectivas circunstâncias, desde o primeiro momento”, nomeadamente com recurso às imagens de videovigilância e recolha de testemunhos. A PSP esclarece que cerca das 3h15, de 21 de Dezembro, recebeu a informação de que, no exterior do bar situado na Avenida Sá Carneiro, em Bragança, estariam a ocorrer desacatos, tendo sido accionados os meios policiais, que chegaram ao local às 3h21 e que não viram “qualquer desordem no exterior do bar”. “No local apenas se encontravam dois cidadãos, um dos quais informou os polícias que teria sido agredido por um grupo de jovens, que já não se encontravam no local, não desejando qualquer tratamento hospitalar, nem procedimento criminal”, refere o comunicado. Depois de recolhido o testemunho, os polícias, tentaram localizar os suspeitos ou possíveis testemunhas, “sem resultado”. Já cerca das 3h45, um outro meio policial, em serviço de patrulha, deparou-se com um jovem caído no chão “inanimado e com forte odor a álcool proveniente do vomitado no seu vestuário”. “Face a este cenário, foi imediatamente accionada pelos polícias a assistência médica (INEM), tendo o jovem sido transportado pela ambulância dos bombeiros às urgências”. Foi a unidade hospitalar de Bragança que cerca das 6 da manhã contactou a PSP e informou que o jovem que “ali havia dado entrada, teria sido vítima de agressão”, revelou a nota. Segundo a PSP, os amigos forneceram a identidade do jovem, tendo informado que, pelas 2h30, no interior do bar, quando se preparavam para sair, a vítima terá tido um desentendimento, mas que teria ficado sanado. Os jovens relataram que, à saída do bar, “ocorreram agressões com um grupo de 15 a 20 jovens, motivo pelo qual fugiram, desconhecendo para onde se teria deslocado” Giovani. Na nota acrescenta-se que, após a morte do estudante cabo-verdiano, a PSP informou “de imediato” a Polícia Judiciária de Vila Real, que é a força “com competências legais de investigação” e que tomou conta do caso, ouvindo suspeitos e testemunhas. No entanto, ainda não houve detenções.

Jornalista: 
Olga Telo Cordeiro