Máquinas revolucionam segada

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Ter, 02/08/2005 - 15:52


José Fernandes já perdeu a conta às vezes que trocou a farda de militar pela camisa de agricultor para arrancar da terra 60 toneladas de trigo e centeio.

Do pai herdou terras e a paixão pelo campo que o leva a aproveitar férias e fins-de-semana a cultivar cereal numa extensa área da zona de Alfaião, no concelho de Bragança.
Hectares são 50 e, nos tempos que correm, a faina dura quatro ou cinco dias, “das 9 horas à meia-noite”, explica o capitão do Exército.
Com propriedades de tamanha dimensão, escusado será dizer que a segada não se faz à moda antiga, mas com a preciosa ajuda duma ceifeira debulhadora mecânica, duma enfardadeira a condizer e de dois tractores. São estes os equipamentos que substituem as dezenas ou centenas de segadores que demorariam quase dois meses a fazer o trabalho que as máquinas acabam em menos duma semana.
Numa altura em que as recriações de segadas e malhadas à mão marcam os calendários de diversas associações recreativas, o Jornal NORDESTE foi saber como se faz a ceifa mecanizada.
A jornada começa pela frescura da manhã, com a limpeza e lubrificação das máquinas, e só termina à noite, já a salvo do sol castigador da primeira quinzena de Julho. “À meia-noite ou uma da manhã tem que se parar porque a palha começa a ficar húmida”, explica José Fernandes.

A equipa

Ao volante da ceifeira debulhadora fomos encontrar Antero Teles, um agricultor de Freixedelo que, na época das segadas, calcorreia os campos de cereal do Nordeste Transmontano.
Após a passagem da ceifeira mecânica, entra em acção a enfardadeira puxada pelo tractor conduzido por Hélder Alves, um estudante de Radiologia que, em tempo de férias, troca as aulas no Piaget de Gaia pela faina agrícola.
Quando a debulhadora pára para descarregar o cereal, entra em cena um homem que, durante as curtas férias, substituiu o jipe de comando dos Bombeiros Voluntários de Bragança pelo tractor que transporta toneladas de grão de trigo ou centeio. “Gosto disto”, justifica José Fernandes, enquanto combina com a esposa a hora do almoço que há-de matar a fome e sede aos três “segadores”.
A hora do mata bicho já lá vai e o militar encarrega-se de entregar a Irene Fernandes as arcas de piquenique que, na próxima viagem, transportarão o almoço, a merenda e as bebidas para mais um dia de segada.

Cultura rentável

Apesar da ajuda das máquinas, não se pense que ceifar cereal deixou de ser um trabalho duro, principalmente quando o calor e o pó não dão tréguas.
Mas, na hora de fazer as contas, os resultados nunca desiludem José Fernandes. “Se for em quantidade a cultura é rentável”, assevera o capitão do Exército.
Se assim não fosse, o militar e mais dois produtores de cereal não se tinham aventurado na compra da enfardadeira mecânica e da ceifeira debulhadora, máquinas para alguns milhares de euros.
As vendas também justificam o trabalho, pois o preço da palha ombreia com o do cereal. “As sementes e os adubos aumentaram, ao passo que o preço do cereal baixou. O que vale é que o custo do fardo de palha subiu e dá para equilibrar os lucros”, considera o produtor.
Além da mecanização, a qualidade das sementes e a adubação são outros dos segredos.
“Com a variedade R1, que são sementes de primeiro ano, e adubando em quantidade, consigo produzir entre 4 a 5 toneladas de trigo por hectare”, garante o oficial do Exército.
“E se fosse com regadio?”, perguntámos. “Aí conseguia-se 6-7 toneladas por hectare, como em Espanha e França, mas o mecanismo de rega é caro e há escassez de água”, responde prontamente José Fernandes.
Quanto ao escoamento da produção, não restam dúvidas. Durante a realização desta reportagem, o produtor foi contactado telefonicamente por compradores de palha e cereal. E, quando já está tudo vendido, o telefone continua a tocar. Quem disse que já não compensa apostar no cereal?