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A guerra do protocolo

Qua, 31/05/2006 - 15:11


Algumas pessoas andam pálidas de raiva porque o protocolo do Estado vai levar uma volta, sendo absolutamente normal e natural que apareçam novas regras no cerimonial.

O protocolo é uma invenção para se colocar alguma ordem na emergência de recebermos pessoas estranhas, mais ou menos ilustres, convidados e comitivas de todo o género. O protocolo tem imensas nuances, artimanhas e leituras, sem esquecer os especialistas na sua quebra. Nesta guerra das bagatelas o Sr. Procurador Souto Moura exige ser equiparado ao presidente do Supremo Tribunal de Justiça, não lhe podendo nós exigir mais celeridade nos processos que avocou, isto para não falar do célebre caso do envelope nove. A querela do protocolo trouxe-me à lembrança as infindas birras, zangas e raivas protagonizadas por muito boa gente de Bragança nos idos em que eu flanava por ruas e vielas. Os donos de memória não esquecem as precedências no pegar nas varas do palio e na colocação de tão ilustres individualidades nas primeiras filas logo a seguir, para que as procissões tivessem o adequado luzimento e solenidade. Só que proprietários de proeminentes barrigas a colocarem em perigo os botões das “abas de grilo” empurravam os magricelas a bambolearem as magras canelas nas calças cinzentas listadas, numa luta por mais centímetros de exibição onde não faltavam luvas caídas no chão e imprecações em surdina. O interessante das pugnas estava no facto de os farsolas demonstrarem ao longo dos dias pouca apetência pelas coisas da Igreja, um ou outro não prescindia da teúda e manteúda e quanto a actos de caridade aos acostumes diziam nada. Se nas procissões o verniz estalava devagarinho, nas verbenas, nas inaugurações e beija-mão aos ministros o caso mudava de figura. Por causa de uma cadeira mais à frente, um tio do birrento Manuel Maria Carrilho conseguiu ser melhor artista do que o brasileiro cantor, chamado Odir Odilon. Por causa de um convite um Governador Civil caiu em desgraça, o homem não concedeu a devida importância ao alto funcionário, este sentiu-se ofendido e vai daí moveu influências até remover o desatento governador. Tendo em conta os seus apelidos e brasão, o gardingo não podia admitir ficar sem convite para a inauguração de uma barragem. Entre os militares as regras estavam mais cerradas, no entanto, sempre que podiam os cordiais inimigos dedicavam-se utilizar o protocolo como látego a malhar nas costas de uns e outros. Os da pançuda Legião Portuguesa também entravam na dança, sem esquecer os da União Nacional e depois a ANP. O professor Marcello Caetano veio a Bragança já primeiro-ministro, nesse dia o protocolo levou tratos de polé, tendo uma senhora ajoelhada beijado as mãos ao homem das conversas em família. O Almirante Tomás recebeu uma chuva de papelinhos, apertos de mão ao de longe com as consequentes vénias de quebra-espinha. O picante de tudo residia no facto de os penetras, os convidados e aqueles que fugiam, no dia imediato comentarem jocosamente as peripécias e os trabalhos doas actores principais nos cafés, especialmente no Chave d’Ouro, pois ali se acolhiam as principais figuras do regime em Bragança. Um lugar destacado para ficar na fotografia, uma troca de palavras com o governante vindo de Lisboa e um cartão dado por ele, valiam todos os sacrifícios de apertos. Imaginem o efeito da foto dos dois na sala de jantar, em alturas de receber os parentes da aldeia. Seguramente, dava direito a um bom presunto e a cunha em contrapartida. Os álbuns de posteridades estão repletos de referências desse género. A antítese do homem do protocolo, na altura, estaria na figura do Sr. Albininho de Gostei.