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Finalmente!

Ter, 07/03/2006 - 17:28


Leitor atento, já reparou que, nos últimos dias, os pássaros que sobrevoam a brigantina Praça Cavaleiro de Ferreira não andam com a melhor das caras? É verdade.

E aparentam uma cor esverdinhada que só não se confunde com a frondosa folhagem das árvores porque estamos no Inverno e o leitor, que é guicho, não se deixa enganar por dá cá aquele ramo. Mas sosseguemo-nos, porque as aves que voltejam sobre o Teatro Municipal e suas imediações não contraíram – ao que se sabe – nenhuma estirpe virulenta do tipo pandémico. E o seu aspecto doentiamente verde é antes o efeito de uma maleita de grandes e enraizadas tradições em Portugal Continental e Ilhas.
Pois é, caro leitor, já adivinhou, certamente, que os pássaros em causa foram acometidos de um vulgar ataque de inveja aguda, cujas consequências nos animais ainda não foram estudadas, embora não seja de recear o seu contágio à espécie humana que já está sobejamente imunizada.
Mas, perguntar-se-á o curioso leitor, qual poderá ser o motivo, o móbil, de semelhante atitude por parte da inocente e insuspeita passarada brigantina que nunca, até hoje, mostrou qualquer tendência para tomar outras penas que não fossem aquelas que por natureza e condição lhe tinham sido impostas.
Atento leitor, ainda não atentou – com a devida atenção – na novíssima valência do grandioso Teatro Municipal de Bragança? Não, não é uma sala de cinema; nem uma galeria para exposições; nem uma mediateca; nem um auditório; nem uma loja do cidadão; nem uma sucursal do mercado municipal; nem sequer uma sala de actos de segunda geração. Mas, antes, algo realmente fundamental para a existência do cidadão bragançano e, consequentemente, a do próprio Teatro Municipal.
E porque não quero deixar suspenso o leitor que mora nas avenidas novas de Bragança e só vem à cidade uma vez por mês, estando, por isso, mais afastado das novidades de índole cultural, aqui deixo a última: o Teatro Municipal já tem um bar, dos de certo. Dois, na verdade. Juro. E posso assegurar que isto é absolutamente verdade, porque já lá estive três vezes. E até tomei café. E estive sentada em cadeiras suficientemente confortáveis para me apetecer continuar sentada. E até se ouvia música-ambiente, daquela que não deseja vingar-se dos nossos neurónios. E até havia uma exposição de fotografias de caretos e de caretices. E uma luz que não era excessivamente intimista, nem insuficientemente desgarrada – não impedindo a leitura ou o trabalho, nem tolhendo o desejo de descanso ou de modorra.
E eis que, finalmente, os coruscantes chavões pespegados no papel brilhante do folheto informativo do Teatro Municipal começam a fazer algum sentido: “entrar pelo foyer é uma opção que enriquece o acto de ir ao Teatro”, já que permite “o contacto social antes do espectáculo”. Pode ser que sim. E mais do que isso. Porque o facto de haver um bar duplo – com horário alargado – ao cimo das escadas, junto ao painel da Graça Morais, entre mesas e sofás, com vista sobre a Praça Cavaleiro de Ferreira pode fazer mais pela cultura brigantina do que alguns equipamentos de índole atractivante ou de fachada modernizante que muitos munícipes não conhecem ou cuja finalidade desconhecem.
A abertura permanente de um bar no Teatro Municipal de Bragança atribui a este espaço um carácter utilitário que, sim, pode fazer o público aproximar-se mais e aconchegar-se aos serviços do edifício. Incluindo, naturalmente, os que se relacionam com a vertente cultural e artística. O local ao cimo das escadas, conhecido como foyer (como é que se diz isto em mirandês?) é o primeiro espaço do Teatro ao qual o público tem acesso, possuindo, como é sabido, óptimas condições de permanência, um ambiente naturalmente calmo e uma parede envidraçada com vista sobre a Praça, onde qualquer brigantino pode agora – e finalmente! – esborrachar o nariz para verificar, entusiasmado, a atractividade da taça do repuxo e adjacências. Circunstância que, como o listo leitor terá percebido, estará na origem do esverdinhamento invejoso da passarada que perdeu o exclusivo do privilégio de ver tais vistas, para além de não ter a vantagem de o poder fazer num ambiente climatizado.
E pronto, caro leitor, gostaria de poder dizer que não o vou maçar mais com estas minhas quezilices escarafunchosas, mas tenho de lhe lembrar que, no último piso do grandioso Teatro Municipal ainda se mantém – empatada e estéril como sempre – a caramonada Sala de Actos, suspirando pelo dia anual em que se desmofará um pouco e conhecerá alguma animação. E nesse mesmo piso continua o terraço, com vista panorâmica por ver. O próprio folheto informativo, que já referi, confirma a desrentabilização de que este espaço é alvo: “com a transformação da cobertura do Teatro numa praça de contemplação conseguem-se vistas magníficas sobre o Castelo e a cidade”.
Pois. É aí mesmo, no terraço, que os pássaros se vingam.