Duro mas necessário

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Ter, 31/05/2005 - 17:01


As medidas aprovadas pelo Governo são duras mas necessárias. E, além disso, algumas delas enquadram-se dentro do ideário socialista. São elas a manutenção das SCUT`s sem portagem, o aumento do IRS apenas nos rendimentos mais altos, o fim do segredo bancário e a limitação das vantagens financeiras dos «off-shores».

O Governo Socialista respondeu assim com celeridade ao apelo quer do Presidente da República quer do Governador do Banco de Portugal quer ainda das instâncias internacionais. Este Governo merece pois uma nota positiva, neste aspecto, pois não se esperaria que um Governo Socialista se prontificasse a ir tão longe nos sacrifícios a pedir aos portugueses.
Do lado socialista estão ainda : a opção pela subida do escalão mais alto do IVA para 21% em detrimento de uma opção pelo corte dos salários; o aumento do IRC, de novo para 30%, e a limitação dos privilégios dos titulares de cargos políticos. A opção pela subida do IVA protege os salários mais baixos mas desfavorece a competitividade das empresas. Por isso, baixar os impostos insere-se numa lógica de acção liberal, promovendo a competitividade da economia.
Já o aumento da idade da Aposentação (devia ser aumentado também o tempo de serviço para 40 anos) é inevitável e nem sequer é uma medida política mas sim de gestão corrente face ao envelhecimento e à desjuvenilização.
Na situação actual, de um défice previsto para Dezembro de 2005, de 6,83% do PIB, isto é, de 9,6 mil milhões de euros (o que não quer dizer que, chegados a Dezembro, e sem intervenção, não se verificasse maior, tudo indicando que sim), é necessário realizar dinheiro rápido, pelo que a alternativa ao corte dos salários e das despesas públicas é o aumento dos impostos.
Eu, porém, sou socialista mas preferiria a diminuição das despesas públicas através de portagens nas SCUT`s, através da diminuição das despesas do Estado e, se necessário, através da diminuição dos ordenados. Tudo menos aumento do IVA, do IRC, das despesas de educação e das despesas de saúde. A economia há-de ressentir-se muito destes aumentos.
Em 2005, o Governo espera, sem recurso a receitas extraordinárias, reduzir o défice para 6,2%. O congelamento da progressão automática nas carreiras (Professores, Enfermeiros, Médicos, Forças Paramilitares) ajudará substancialmente a este fim. Mas a continuada retracção da economia pode pôr em risco estes objectivos.
A situação actual é muito difícil e tem como razões fundamentais dois períodos despesistas nos últimos 16 anos. O primeiro período decorre de 1989 a 1991 e corresponde à reestruturação das carreiras da Administração Pública, as quais aumentaram, em média, 40%, as suas despesas. O PSD perdeu as eleições legislativas, em 1995, porque teve de tentar reduzir um défice de 7,9%, em 1992, para 5,9% em 1995.
O Governo do PS (1995-2001) continuou a reduzir o défice até 1999, tendo-o trazido para os 2,9%, em 1999. Porém, conseguiu-o mais graças ao bom período económico do país, entre 1996 e 1999, do que à gestão do Governo. Prova disso é que a situação económica voltou a começar a piorar em 2000 e o défice já estava, no final de 2001, em 4,2%. E a asneira de se ter dado verba para despesas de representação, carro e crédito bancário a todo o «bicho careto» contribuiu imenso para isso. Assim, sugiro que comecem por cortar aí, nessa promiscuidade que se instalou na Administração Pública Portuguesa.
A situação portuguesa é muito difícil. A classe política tem dificuldade em assimilar um discurso técnico mas o debate de hoje (25/5), na Assembleia da República, já trouxe para a cena os grandes motivos do défice português: os problemas estruturais da economia, os problemas de modernização tecnológica e a menor qualidade das formações ministradas. Neste aspecto, também a exigência de uma nota mínima para ingresso no ensino superior, tanto para o ensino ministrado pelo Estado como pelas Organizações Não-Estatais Reconhecidas, é um critério que se deve saudar.
É provável que nos tenham de ser pedidos ainda mais sacrifícios para trazermos o défice para baixo dos 3%. Trazê-lo para este nível é fundamental até para a credibilidade internacional do nosso país.
Os tempos, agora, são outros. Começou um novo ciclo político, a que tem de corresponder um movo ciclo económico e moral. Agora, é necessária mais autoridade, mais responsabilidade, mais justiça social, mais equidade no tratamento das questões sociais, mais ordem, mais disciplina, mais trabalho.
Se os políticos não forem capazes de actuar dentro destes parâmetros vai se difícil.

Henrique Pereira