A arte de transformar a lã

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Qua, 16/08/2006 - 10:46


Transformar a lã de ovelha em tapetes e cobertores é a arte de Fátima Gomes, a última tecedeira de Lamas de Orelhão, no concelho de Mirandela.

Após ter aprendido esta profissão artesanal em criança, para ajudar a mãe, Fátima Gomes decidiu dedicar-se à tecelagem por conta própria há cerca de 20 anos.
O gosto pela arte da tecelagem, o desejo de revitalizar uma profissão em vias de extinção e de amealhar algum dinheiro foram os principais motivos que levaram esta habitante a fazer da tecelagem a sua profissão.
“Eu já nasci nesta arte que comecei a aprender com a minha mãe. Uns dias aprendia uma coisa, noutro dia aprendia outra e, ao fim de algum tempo, já conseguia fazer uma peça sozinha”, recordou Fátima Gomes.
Aos 50 anos, esta tecedeira lembra os tempos em que não resistia a experimentar o tear da sua mãe.
“Muitas vezes, quando a minha mãe ia fazer o almoço, eu entrava para o tear para tentar pôr em prática aquilo que tinha observado. Depois, a minha mãe acabava por ter que desfazer tudo, porque não ficava bem feito”, ironiza a tecedeira.

A última tecedeira da aldeia

Com 8 anos, Fátima Gomes já fiava a lã que a mãe usava no tear e ajudava nos processos de abrir a lã e cardar.
“Ainda não podia entrar para o tear porque era muito pequena. Por isso, ia vendo como a minha mãe fazia”, acrescenta a artesã.
Aos 15 anos, começou a fazer peças em lã, nomeadamente tapetes, cobertores e mantas, que, posteriormente, eram vendidos para o sustento da família.
Com o passar dos anos, Fátima Gomes decidiu dar continuidade a esta profissão que caracteriza muitas das aldeias da Terra Quente.
“Na minha terra chegaram a existir 25 tecedeiras. Hoje só sou eu a dedicar-me a esta profissão e quando eu deixar de trabalhar, a tecelagem acaba em Lamas de Orelhão”, lamenta a tecedeira.
Quanto à matéria-prima, Fátima Gomes afirma que consegue encontrar lã em abundância na região, principalmente no concelho de Mirandela, onde ainda há muitos rebanhos.
Contudo, a artesã garante que a maior parte das tecedeiras abandonou a profissão devido ao trabalho que é preciso fazer até se conseguir acabar um tapete ou um cobertor.
“Primeiro lava-se a lã, depois começasse a abrir, a seguir carda-se, com o fuso fia-se e só aí é que a lã está pronta para ser trabalhada no tear”, descreveu a tecedeira.

Tecelagem à beira do fim

Tendo em conta as inúmeras tarefas que antecedem o produto final, Fátima Gomes afirma que prefere não contabilizar as horas gastas para conseguir fazer uma peça.
“Se fosse a fazer conta ao tempo tinha que vender os meus artigos muito mais caros”, enfatiza a artesã.
Os preços das peças confeccionadas por esta artesã variam consoante o tamanho: um tapete de quarto ronda os 35 euros, enquanto uma carpete de maiores dimensões pode chegar aos 165 euros.
Apesar da crise que se faz sentir, Fátima Gomes afirma que vai conseguindo vender os seus artigos, que dá a conhecer nas diversas feiras de artesanato em que participa.
“É preciso aparecer a pessoa certa para comprar estas peças, porque nem toda a gente gosta destes artigos artesanais”, frisou a tecedeira.
Dado que é preciso esperar pela venda das peças para realizar dinheiro, a tecedeira conta que já teve aprendizes no seu atelier, que acabaram por abandonar a arte.
“Eu pagava-lhe as horas que elas trabalhavam para mim e, ao mesmo tempo, aprendiam. Mesmo assim, não quiseram ficar, porque acharam que não era rentável”, lamenta a última tecedeira de Lamas de Orelhão, que ainda tem esperança no aparecimento de seguidores na arte de manusear o tear.