Ter, 18/10/2005 - 15:28
Esse processo muito pouco pacífico viria a durar décadas, durante as quais os dois países disputaram – entre propostas e contrapropostas – cada légua marítima possível, de acordo com as conveniências estratégicas de cada governante.
Os reis católicos, Fernando e Isabel, acabaram por aceitar como pertença de Espanha todos os territórios descobertos para além do meridiano, 370 léguas a ocidente de Cabo Verde, abrindo uma excepção para as descobertas que Colombo pudesse vir a fazer, cujo limite era encurtado para 250 léguas na sua segunda viagem, por esta ter sido iniciada antes da assinatura do acordo. Na zona de influência portuguesa situava-se um território que viria a ser descoberto seis anos mais tarde, em 1500, o que terá feito crer a vários historiadores que D. João II já conheceria a existência do Brasil. Incluía, também, o hemisfério português as Ilhas Malucas, pululantes de especiarias. Mas tão difícil se mostrou ser a demarcação real e concreta das longitudes que o arquipélago foi, durante anos, objecto de discussão e disputa relativamente à sua localização e consequente soberania, por parte de portugueses e espanhóis.
Seis séculos mais tarde e em território com denominação geográfica definida me encontrava eu, na noite eleitoral de 9 de Outubro, quando me apercebi de que também neste “arquipélago” transmontano se decidia o domínio das doze “ilhas” que o constituem. E cujo valor político é proporcional à dimensão física de cada uma. Como ficou dito por um representante do PSD – em sessão comentadorística na Rádio RBA – na mesma noite em que foram conhecidos os resultados eleitorais. Que, certamente de mangas arregaçadas no afã de certificar a “vitória” do seu partido no distrito, não arranjou melhor forma de desvalorizar a perda da Câmara de Freixo senão com o argumento de que “é um concelho pequenito”. Nem mais. Capaz de insinuar que um partido assim de importante não tem por que se molestar com essas miudezas, como um concelho de 4 mil votantes. E esta perspectiva não deixa de ser reveladora, relativamente às reais motivações de um partido “de poder”, como o PSD, e àquilo que um concelho como Freixo dele pode esperar. Está visto, portanto, que os freixenistas votaram bem. E que teriam todo o interesse em não se esquecer destas palavras de um responsável distrital do PSD. Que terá pretendido baralhar o lance em causa, pela sugestão de um empate técnico entre o PSD e o PS – porque aquele teve uma derrota inexpressiva e este uma vitória insignificante. O que constitui um prolongamento simbólico da hegemonia alternada destes partidos no distrito de Bragança.
E à incontornável pergunta do moderador de serviço de “que partido ganhou?”, os representantes do PSD e do PS lançaram-se numa corrida furiosa, esfalfados de razões. Um porque “temos oito concelhos” e o outro porque “ganhámos mais um”. Ou seja, essa infalível ciência chamada “análise” política continua a provar que – descontando os danos reais – entre vitórias virtuais, percentuais, proporcionais, exponenciais e morais, há sempre prémios disponíveis para os partidos com esse estranho síndroma chamado “vocação de poder”. Que é um vírus que, tanto quanto se sabe, só se adquire depois de se ter tido contacto com esse tal “poder”. O que cria, inexoravelmente, uma espécie de ciclo que vicia os incontornáveis partidos. Que, apostados na alternância, se vêem como as únicas alternativas “credíveis” para presidir aos ofuscantes desígnios de qualquer autarquia. Disputando, por isso – como se viu entre o PS e o PSD – o domínio hegemónico do distrito de Bragança, através de solenes ou eufóricas declarações de “ganhámos, nós” e “não, senhor, fomos nós que ganhámos”.
Quando duas vozes se sobrepõem, esquecem-se de quem as escuta. O que deveria elucidar o povo relativamente aos ganhos e perdas. Porque, pela amostra de apego ao poder e de soberba eleitoralista, já se percebe que não serão os munícipes que ficarão a ganhar com os ganhadores do costume.
Nota Final: Lamento que, mais uma vez, a CDU não tenha conseguido eleger um vereador para a Câmara Municipal de Bragança. Quando é que os brigantinos perceberão que o conceito de “voto útil” também deve ser aplicado à oposição?
Um vereador da CDU fazia falta. E não era só para animar a malta…