ÁGUA – BARRAGEM DO BAIXO SABOR

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Qua, 24/08/2005 - 15:00


O Rio Sabor, de águas límpidas, onde aprendi a nadar há quase seis décadas, exerceu em mim um fascínio absorvente.

Ao percorrer a cavalo, em criança e adolescente, o caminho de Mogadouro a Santo André, sentia grande empolgamento, quando ao passar do Souto, no fim de uma curva mais cerrada se atingia o topo de pequena ladeira e avistava, lá no fundo o nosso rio, o Sabor.
À medida que me aproximava, as águas que inicialmente pareciam ronceiras a beijar docemente as ladas mais ou menos íngremes, tornavam-se vivas, atingindo alguma inquietação ao galgar os açudes dos moinhos do Senhor Dulval e dos Freitas.
A vida no rio era intensa. Moinhos activos com cargas de trigo e centeio a entrar e de farinha a sair.
Os cardumes de Barbos e Bogas faziam na água manchas mais ou menos compactas, enquanto que enguias e lampreias afloravam sazonalmente.
O movimento dos pescadores, dos moinhos, dos pastores de rebanhos e cabradas, enchiam de vida as margens do rio.
Passaram-se anos, mudou-se o rio, e mudou-se o mundo.
O rio doce de águas cristalinas, deixou de albergar enguias, lampreias, moinhos, moleiros, cabradas e rebanhos, perdendo vida, perdendo alma.
O mundo mais quente e empedernido está faminto de energia e sedento de água.
O Rio já não é mesmo, chamam-lhe selvagem. Selvagem porque não tem barragens, nem lampreias, nem enguias, nem moinhos, nem sequer água. Pobre Sabor estás seco.
Imediatamente a montante e a jusante da Ponte de Remondes nem uma gota se move no leito. Só vemos godos, fragas, areão e, de quando em quando, umas poçacas de águas paradas.
Agora sim, temo pela alteração profunda do ecossistema do Vale do Sabor.
Fico a pensar, na albufeira da futura Barragem do Baixo Sabor e em tudo quanto os Ecologistas nos dizem de forma pouco clara e generalizada.
Gostava de saber concretamente no concernente à fauna e à flora, o que se extingue, o que se mantem e em que percentagem e se algo se recria ou aparece de novo, com a construção da Barragem.
Gostávamos também de saber o que aconteceu, do ponto de vista ecológico, com a construção da Barragem de Picote, Miranda e Bemposta e, já agora também, com a Barragem de Penas Roias.
Tenho a convicção que nada se extinguiu, salvo, a visualização parcial das margens submersas.
Três de Agosto de 2005, 20.00 horas, TVI “O Governo declara que a seca atingiu gravidade máxima 100%”.
Trinta e um de Julho de 2005 recolhi imagens do leito do Rio Sabor ….. completamente seco.
Considero inconsciência confrangedora protelar a construção da Barragem do Baixo Sabor.
Não se conhecendo argumentos de impacto ambiental válidos e concretos e com necessidade premente de constituir reservas de água, necessidade que vai acentuar-se face às alterações climáticas que se desenham e ao aumento do consumo, não precisamos de invocar as dezenas de argumentos que impõem a sua construção.
Precisamos é que nos digam o que leva “os mais esclarecidos” a não verem tão longe.
Quer queiramos quer não e apesar das múltiplas facetas da politica da água, a solução base e “sine qua non”, será sempre a reserva de água, ampla e dessiminada por todo o território, o que passa pela construção de grandes e pequenas barragens, de charcas e outros.

Morais Machado