5 Em Linha: o Debate

PUB.

Ter, 04/10/2005 - 14:45


A alternância democrática é um chavão criado pela democracia, que assenta na convicção de que, em abstracto, qualquer força partidária pode aceder ao poder. Invariavelmente, porém, não há grandes variações relativamente às alternativas que essa mesma alternância acaba por provocar.

Por isso, um debate entre representantes de diferentes partidos constitui, geralmente, uma forma de microcosmos dessa particularidade democrática. Porque se afinca no conceito de paridade entre as diversas forças, que podem assumir-se como potenciais ganhadores: através de propostas, medidas e projectos, desvalorizando os adversários pela indiferença ou condescendência; ou massacrando os oponentes ameaçadores com contra-medidas de efeito arrasador. É que a importância, em termos relativos, de cada partido – ou candidato – é avaliada pela forma como o seu representante é visado por outra força partidária. Ou porque ambos ocupam uma área politicamente próxima, que querem distinguir; ou porque percebem que constituem os pólos de uma alternância que fará de um deles, apenas, o protagonista que se segue.
Como se ouviu no debate organizado pela rádio RBA, no sábado passado, onde estiveram presentes os cinco candidatos cabeças de lista à Câmara Municipal de Bragança.
E onde a fúria surda entre o candidato do PSD, Jorge Nunes, e o do PS, Marcolino de Jesus, denuncia, sem margem de erro, o duelo entre o poder e o querer: “não admito que me interrompa” / “não houve desenvolvimento sócio-económico, nem criação de riqueza”. José Castro, representante da CDU disparou na direcção dos dois principais partidos (“propusemos a criação de uma empresa intermunicipal – de água – que não foi aprovada pelos votos contra do PSD e do PS”), mantendo sempre uma reserva de munições destinadas ao PS. Circunstância que faz subir a cotação de Marcolino de Jesus, mostrando-o como candidato potenciador de uma vitória. O CDS-PP, representado por Carneiro Gonçalves, assumiu-se como um aguilhão na couraça do candidato do PSD (“o Eng.º Jorge Nunes precisa de uma pessoa que o contrarie, que faça uma oposição forte (…) é prepotente, ditatorial”) e da sua gestão – relativamente à indisponibilidade da Câmara em ceder um local para a instalação de uma empresa agro-alimentar, que acabou por se fixar em Vila Real.
E se a estratégia do ataque crítico define a força do candidato que é alvo dela, então estamos esclarecidos sobre a irrelevância do Bloco de Esquerda que, através de Conceição Gomes, se definiu como “voz desta nova esquerda”. Apesar da atitude muda, ao longo de todo o debate, assente em fórmulas de “não tenho dados sobre Bragança”, “a posição do Bloco é…”, “ao nível de Bragança não tenho conhecimento”. Através de ideias generalistas de largo espectro, arrastando-se entre a ecologia e a instalação de TV cabo nas aldeias – como propostas de um manifesto de intenções, lidas de rajada. O que nos faz pensar que esta “nova esquerda” – tal como o Portugal oitocentista de Eça de Queiroz – se circunscreve a Lisboa, ficando-se, no resto do país, pelos cartazes que se acrescentam à paisagem.
Quanto à “velha esquerda” – eventualmente com menos irreverência mas mais conhecimentos – parece-me estar em boa forma, aqui por Bragança. José Castro, da CDU, revelou-se esclarecido e esclarecedor nas suas intervenções: “há muitas perdas, em termos de financiamento, por falta de planeamento”, “é um exagero dizer que há exagero de equipamentos culturais; devem é ser postos a funcionar”. Mostrando-se capaz não só de criticar a vereação socialista do executivo cessante, pelo colaboracionismo pactuante no caso do Relatório do Tribunal de Contas, como, também, e fundamentalmente, de apontar ao candidato do PSD erros estratégicos de uma política cegamente massificadora: “O nosso mundo rural não é todo o mesmo. É preciso dar carácter e diversidade às nossas aldeias, devendo haver separação de poderes para as freguesias definirem o seu ponto estratégico”. Como resposta ao rol que Jorge Nunes – num tom robotizado – desfiou, relativamente aos saneamentos e calcetamentos nas aldeias que estão “na senda do embelezamento”.
E esta troca de perspectivas acaba por revelar uma particularidade da gestão do executivo PSD, que é apontada pelas três principais forças da oposição: a falta de um planeamento estudado, no afã de mostrar obra abafante. Como resposta às críticas, Jorge Nunes embandeira o seu lema tripartido – “modernidade, qualidade, atractividade” – o que constitui uma forma de desvalorizar a acusação de falta de funcionalidade de muitos equipamentos (Mercado, Matadouro, Teatro…), que é substituída pela “qualidade” (conceito mais abstracto e, por isso, menos negável). Justamente, no tema relativo ao planeamento e equipamentos da cidade, o PS distinguiu as obras de iniciativa governamental daquelas que a Câmara Municipal apresentou por sua conta. No caso das primeiras – programas Polis e Procom – os objectivos de despoluição do Fervença e de requalificação da zona histórica (cada vez mais deserta) falharam. Estando o comércio tradicional, segundo Marcolino de Jesus, em estado lamentável, e tendo encerrado dezassete lojas no ano passado. Quanto às obras de iniciativa camarária, o candidato do PS referiu o incontornável “negócio danoso” do Fórum Teatrum; o inexplicável túnel e sua saída “potenciadora de acidentes”; o subaproveitado Teatro; o inconsequente Mercado.
E quanto à localização da ETAR?
A oposição em bloco manifestou-se contra a sua manutenção junto à cidadela, por “uma questão de saúde pública” e por ser preciso candidatar aquele espaço a património mundial – como afirmou o PS – e porque quanto mais tarde a ETAR for deslocada – como acentuou o candidato da CDU – “mais gastos terá havido em termos ambientais, patrimoniais e económicos”.
À proposta lançada pelos moderadores de uma obra estruturante, as respostas dos cinco candidatos foram diversificadas e esclarecedoras. Jorge Nunes clamou pelos “cidadãos, qualidade de vida e bem-estar”. O Bloco de Esquerda fez saber que “não temos”. O PS avançou com “o Parque Industrial”. O CDS/PP referiu a “implementação de um sistema de recolha e valorização de resíduos florestais e agrícolas”. Quanto à CDU, apontou “o Ambiente (…) e a Universidade de Bragança como pilar do futuro”.
Por debater ficaram temas como o papel das autarquias na educação; a reabilitação urbana da zona histórica e a consequente desertificação do centro da cidade; a revitalização do comércio tradicional; e a fundamental questão do Imposto Municipal sobre Imóveis.
No minuto final dado a cada candidato, o PSD apelou aos cidadãos, no sentido de exercerem o “seu direito de cidadania”, porque “propomo-nos continuar a trabalhar”. A CDU e o CDS/PP invocaram a necessidade de haver uma vereação forte na oposição do executivo. E, aproveitando a deixa, o PS lembrou que conta com a vitória, referindo os seus projectos de melhoria da qualidade de vida, fixação à terra e criação de empresas.
De alternativas deve ser feita a alternância.