Condenado e Presidente

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A América tem finalmente um Presidente eleito que é um criminoso já condenado e com muitos processos em andamento que o podem condenar e até levar à prisão. Se não tivesse sido eleito, certamente iria agora diretamente cumprir pena pelos crimes de que é acusado. A condução do assalto ao Capitólio como protesto da derrota que sofreu para Biden, é talvez o processo mais importante e que o irá condenar mais tarde ou mais cedo. Um rol imenso de crimes e acusações contra ele bastam para o rotular e esperar uma condenação severa. Será a primeira vez que um Presidente americano é condenado, mas há sempre uma primeira vez. A vitória republicana não seria nada de especial se não fosse protagonizada por uma pessoa que já conhecemos e que não deixou saudades. Contudo, muitos hoje, referem que se ele se tivesse mantido no governo da América, o mundo hoje estaria melhor. Estaria? Putin gostou da vitória de Trump. Diz que está disposto a encontrar-se com ele e a discutir a paz da Ucrânia e a voltar ao tempo da confiança com o Ocidente e com os países europeus. Será? Entretanto é aliado do Irão, da Coreia do Norte e da China. Ele fez grandes promessas durante a campanha e uma delas é que acabaria com a guerra da Ucrânia de um dia para o outro, mas não disse qual seria o dia. Mais amigo de Putin do que de Xi, talvez chegue a um acordo sobre essa tão desejada paz, mas Zelensky terá certamente a última palavra. Aliás, esta vontade de Putin chegar a uma paz, seja ela qual for, só põe mais a claro as dificuldades que a Rússia enfrenta em termos globais, seja de armamento ou de soldados. Já foi preciso recrutar imberbes da Coreia do Norte para colmatar as falhas. Enfim! E dizer que quer que as relações com o ocidente e com a União Europeia voltem à normalidade com confiança de parte a parte, é igualmente prova disso mesmo. Resta saber o que é que ele vai querer em troca. Victor Órban é outro presidente que queria que Trump tivesse ganho há quatro anos. Diz que não teria havido guerra na Ucrânia e que a Europa estaria mais forte e segura. Acrescenta que a América seria mais forte economicamente e Trump teria cumprido os acordos assinados. Quais? Ele até saiu do Acordo de Paris e talvez queira agora acabar com a NATO. E ainda não sabemos o que vai na ca- beça dele a esse respeito. A verdade é que os pretensos ditadores se juntam e comungam das mesmas ideias. Com a vitória de Trump, talvez a China não se movimente contra Taiwan, já que pode enfrentar um escudo que a impede de chegar ao Pacífico, desde o Japão, Indonésia, Taiwan, Coreia do Sul e Austrália onde existem bases americanas. Talvez Taiwan continue a salvo de uma invasão da China. Mas fica no ar o acordo que Putin fez com Xi e com o líder da Coreia do Norte. Como vai descalçar a bota? Isto é francamente o saldo mais positivo da vitória de Trump. Na verdade, a América não quer guerra com ninguém, mas não vai deixar para outros a liderança da política mundial. Do mesmo modo, os outros líderes também não pretendem a guerra. Talvez Israel seja exceção. Com a vontade de se afirmar e conquistar território, deixa para segundo lugar a destruição, os mortos que ficam pelo caminho e o genocídio que leva a cabo em Gaza, sem razão alguma que não seja essa mesma. Mas também Netanyahu espera de Trump o maior apoio nesta guerra que não é americana e onde todos têm a perder. Só Netanyahu espera ganhar. Assim, Trump tem pela frente uma série de problemas que terá de resolver o mais rapidamente possível, se conseguir. Tem pelo menos a facilidade de ter ganho em todas as frentes e nada o impedir de tomar decisões e alterar inclusive, leis do anterior executivo. Perigoso, muito perigoso. Sem ninguém para o controlar, imprevisível e até contraditório como é, pode pôr em perigo a estabilidade do planeta e levar a uma terceira guerra mundial. Se a guerra da Ucrânia não parar e a Rússia continuar a entrar pela Ucrânia dentro, se Trump retirar o apoio à NATO e à Europa, nada impede Putin de querer refazer o antigo território da Federação Russa, o que leva ao facto de haver três países satélites da Rússia que pertencem à União Europeia. Como vai a Europa defender esses países que pertencem à UE e à Nato? Onde estão as tropas europeias? A Europa só agora acordou para esse facto. Nunca se pretendeu construir um exército europeu que defendesse a Europa de qualquer ataque, porque nunca se imaginou que isso fosse necessário, mas pelos visto é. A Europa precisa de garantir a própria segurança. Demasiado tarde, talvez. Ninguém quer a guerra, mas certo é que ela ronda a Europa, o Médio Oriente e até a Ásia. Assustador. Os americanos têm agora o presidente que escolheram democraticamente. Bom para uns, mau para outros, a ele cabe resolver os grandes problemas que existem den- tro da América e fora dela, especialmente os que a ela se ligam diretamente. A América não é uma ilha. Precisa de todos e todos precisam dela em termos de segurança e em termos económicos e sociais. Curiosamente, cabe a um condenado e criminoso, resolver as equações que estão em cima da mesa. Não é fácil, mas se as resolver, ficará para a História com uma página bem menos negra.

Luís Ferreira