Fernando Echevarría

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Ofereça-se ao vento

o timbre desta taça.

Crepúsculo do vinho

que ela erguia…

In Poesia (1956-1979)

As gazetas e as pantalhas informaram o Planeta, da passagem para o mundo dos mortos deste extraordinário poeta cantor emérito do Húmus e revestimento vegetal das terras frias portuguesas numa cantata a levar-nos a ouvir até à exaustão Bach e Monteverdi. Ia fazer 92 anos, deixou obra de tomo, fundamentalmente no domínio da poesia que inúmeros momentos de prazer, soledade e reflexão me proporcionou e vai continuar a manter-me atento a tudo e a todos enquanto continuar a desfrutar do enlevo de receber os exaltantes diurnos e os negrumes nocturnos. Foi numa tarde de libações onde as taças se ergueram vezes sem conta e, a dada altura, o meu saudoso amigo, o poeta surrealista António José Fort cansado de ouvir as minhas odes ao poeta Teixeira de Pascoaes, ao seu Marânus e a Arte de ser português, disparou boca fora como se estivesse, e esteve, a fritar palavras em Paris no apogeu do Maio de 1968: «Se queres pensar no maravilhoso da Natureza, lê o místico Fernando Echevarría. Estávamos em 1975, não conhecia o cantábrico de nascimento, prometi a mim mesmo decifrar o «enigma» dado que o Fort poeta iconoclasta também se sentia bem na pele de Pitonisa.

Tem a secura virtual do luto a sua luz implícita… 

A luz da sua poesia faz- -me intuir o luto que me persegue desde tenra idade, quatro anos, ser cousa prenha de negrura de diferentes categorias e ordenações porque os lutos e as trevas das tristezas não se medem pelo mesmo rasoiro, nem do mesmo coador de desgostos e angústias. O poeta é filósofo cabouqueiro de estrénuo esforço limador da agudeza dos aforismos. E, vou e estou lendo. A espiritualidade nos seus poemas irrompe aso borbotões. O filósofo e «teólogo» Mircea Eliade não leu o poeta ora falecido quando viveu em Lisboa, se o tivesse lido verificaria quão singulares hierofanias emergem na sua vasta produção, por razões afectivas permito-me lembrar os majestosos castanheiros dos soutos de Lagarelhos bem como os carvalhos da Serra de Nogueira e adjacências. Estas formidáveis hierofanias só por si alumiam os dias cinzentos e as noites de penumbra onde os mortos e os vários modos de morrer deram ensejo a o ofício de talhar as palavras é executado até ao esplendor do pensador poeta lídimo marceneiro da linguagem. O nosso conterrâneo Telmo Verdelho, catedrático na área das linguagens que acaba de ser eleito sócio correspondente da Academia Brasileira de Letras senão entender a minha sugestão como mimetismo do sapateiro de Apeles, ficava feliz se pudesse reservar alguma atenção do seu precioso tempo para as cogitações de Echevarría relativamente ao seu ardoroso amor à referida Natureza qual émulo de S. Francisco de Assis.

Outubro é como um licor. Cintila 

Falta-me engenho cintilante de modo a expressar a felicidade de ter conhecido o poeta, de o ouvir despojado de travos de espúria vaidade, nesta desajeita crónica procurei dar conta da admiração que desde o já dilatado e sulfuroso tempo de 1975, fui cimentando através dos poemas que ele pacientemente burilou.

De não dizer-te nada reaprendo: os dias da memória em solidão.

Presente P.S.- Armando Vara foi libertado da prisão. Congratulo-me com o facto.

Armando Fernandes