Ter, 07/03/2006 - 18:20
Que mal lhes pergunte: então se as maternidades não têm qualidade de prestação de serviço, não seria mais lógico promover iniciativas tendentes à melhoria dessa reclamada qualidade? Não. Pelos vistos é mais fácil e prático encerrar. E ponto final! Encerra-se e o problema acaba ali mesmo. Mais nada!
Mas, para infelicidade dos últimos moicanos do interior de Portugal, a cruzada não se resume às maternidades. Depois das escolas, vão os tribunais da maior parte das comarcas do nordeste. A ser verdade o que corre pelos “mentideros” da justiça, em breve teremos apenas três tribunais a funcionar no distrito de Bragança: em Macedo de Cavaleiros, em Mirandela e na capital do distrito. Que dizer sobre esta medida? Pouco mais nos resta que não seja pedir que coloquem umas cancelas nas principais vias de acesso ao nordeste transmontano com uma placa a indicar: “reserva de caça e pesca”.
Já tentei fazer um esforço para perceber a forma de pensar desta gente que nos tem governado (seja qual for a cor política) e não consegui. Eles promovem o encerramento de serviços porque alegam que aqui não há gente suficiente que justifique a sua manutenção (vide o caso das maternidades). E, como é óbvio, numa lógica de “pescadinha-de-rabo-na-boca”, quem pretende instalar-se aqui, foge a sete pés, porque se não há serviços mínimos, então também não há qualidade de vida. E lá vamos nós engrossar alegremente as filas de trânsito da VCI e da CRIL...
Recentemente, a propósito da questão das maternidades, ouvi o deputado Mota Andrade afirmar na comunicação social regional, qualquer coisa como isto: “o mercado irá ditar as opções das parturientes...” (não são as palavras exactas que ele proferiu, mas espelham a ideia que quis transmitir). Se Olof Palme lhe desse ouvidos, certamente iria dar muitas voltas na cova. Penso que é extremamente grave que um deputado eleito por um partido que se chama “socialista” afirme uma coisa destas. Poderia gastar rios de tinta a explicar-lhe o que deve ser um “estado providência” e quais as suas obrigações para com os cidadãos (todos!) de uma nação. Poderia gastar ainda mais tinta e latim a explicar-lhe o significado de algumas expressões vertidas na Constituição da República Portuguesa. Acredito que seria pura perda de tempo... Talvez o partido se deva adaptar aos tempos e mudar de nome (como há quinze anos atrás, numa reunião da JS de Coimbra, sugeriu o meu amigo Paulo Penedos). Assim não engana ninguém!
E os políticos locais o que fazem? Nada, a não ser falar mais alto para ver quem tem mais razão! Tirando a mediática acção do presidente da Câmara de Mirandela que pôs meio Portugal a falar dos seus cartazes (foi criticado, mas teve visibilidade e obteve resultados. E isso é o que, neste momento, importa!), ninguém mais (do poder instituído) se atreveu a fazer barulho e a reivindicar. Quando sugeri em reunião de Câmara, da qual faço parte enquanto vereador da oposição, que se promovesse um boicote às eleições presidenciais no nosso concelho, como forma a conferir visibilidade às nossas legítimas reivindicações, foi-me respondido pelo Vice-Presidente da Câmara Municipal de Mogadouro, Dr. João Henriques, que uma questão não tinha nada a ver com as outras. Mais uma vez, puro logro. O resultado esteve à vista: as localidades que boicotaram o referido sufrágio tiveram toda a atenção mediática centrada nos seus problemas. O tempo encarregou-se de me dar razão. Como infelizmente ma vai dar nos restantes assuntos. A lógica do “governo de merceeiro”, feito com a máquina de calcular na mão, não se esgota com este executivo. O encerramento das escolas e das maternidades já vinha dos governos anteriores. Tirem daí as vossas ilações. Eu, que carrego comigo o estigma da interioridade, já tirei a minha: querem fechar o interior para balanço! O Estado, através dos sucessivos governos de orientação neo-liberal, está a demitir-se paulatinamente das suas funções de protecção e de garante da igualdade social entre os cidadãos deste país, criando um imenso e avassalador fosso sócio-económico entre os portugueses do litoral e os do interior (os de primeira e os de segunda). E se os políticos nordestinos não têm capacidade para se opor à criação dessa desigualdade estrutural, então... demitam-se!
Antero Neto
Advogado e vereador da Câmara Municipal de Mogadouro