Ter, 07/03/2006 - 17:35
Dávamos longos passeios e eles iam-me contando vivências e passagens da sua infância. Com eles aprendi os nomes de inúmeras flores e pássaros dos quais me contavam histórias engraçadas que sempre me deliciaram.
De todos os passeios que demos, relembro um com especial carinho: eu, a minha mãe e os meus avós decidimos ir visitar a Pala dos Mouros, uma enorme rocha suspensa noutras três fragas mais pequenas, perdida na periferia da aldeia transmontana, Peredo de Bemposta. Planeámos o passeio com antecedência, fizemos um belo lanche, meti numa mochila um livro e os binóculos e, depois de almoço, pusemo-nos a caminho.
Foi por altura da Páscoa, estava uma tarde solarenga, ainda que uma leve brisa teimasse em nos refrescar. Por atalhos, trilhos e carreiros atravessámos o monte, alegremente. A minha mãe e os meus avós relatavam-me peripécias pelas quais tinham passado. Por vezes, éramos interrompidos pelo singular cantar do cuco numa árvore próxima ou pelo chilrear dos passarinhos que exibiam os seus belos trinados. Finalmente, chegámos. Sentámo-nos sobre as pedrinhas à sombra da imponente Pala dos Mouros. Tirei o meu livro da mochila e durante alguns momentos embrenhei-me na leitura, no entanto, a natureza que me rodeava chamava-me. Não consegui ficar sentada. Com os binóculos, eu e a minha mãe, descemos por um carreiro íngreme e encavalitadas nas altas rochas sobranceiras ao Douro, prostrámo-nos sobre a paisagem magnificente que conseguíamos perscrutar. Enormes escarpas ladeavam o rio que seguia, calmamente, o seu leito, lá em baixo. Abutres planavam sobre o límpido curso de água, que se espreguiçava estendendo os longos braços que demorariam, ainda, a alcançar o mar.
Regressámos à Pala. O passeio tinha-nos aberto o apetite. Comemos o lanche, que nos soube pela vida, respirando a longos haustos o ar puro e vivificante do campo. Diverti-me muito a experimentar uma das brincadeiras de infância da minha mãe: sentada numa giesta, escorregava pelas rochas inclinadas, como se de um escorrega se tratasse. Acabei por romper os calções, mas, pelo que me disseram, a minha mãe e a minha avó, também elas tinham chegado muitas vezes a casa com os vestidos rotos, não se livrando de ouvir um pequeno ralhete.
Nesse dia, regressei a casa feliz. Tinha aprendido muitas coisas e a minha mãe e os meus avós tinham partilhado comigo a infância deles, o aroma do campo, as plantas silvestres…
Ana Catarina Lourenço Ribeiro