class="html not-front not-logged-in one-sidebar sidebar-second page-node page-node- page-node-162601 node-type-noticia">

            

O regresso da “partidela”

Ter, 15/11/2005 - 15:36


O Museu do Ferro e da Região de Moncorvo recebeu, no passado sábado, a segunda edição da “Partidela Tradicional da Amêndoa”.

A primeira iniciativa do género decorreu em Novembro do ano passado, e, como teve bom acolhimento, a direcção do museu decidiu repetir a acção anualmente.
Além de recriar uma actividade em extinção, a “partidela” também visa promover um encontro entre pessoas de todas as idades, da região e de fora dela, com especial atenção aos idosos do Centro de Dia da Santa Casa da Misericórdia e do Lar de Idosos da Fundação Francisco Meireles, em Torre de Moncorvo.
Durante a tarde, assistiu-se a um verdadeiro encontro de gerações, com participantes de diferentes idades a partir amêndoas ao som de músicas tradicionais, versos, histórias e conversas. Tal como manda a tradição, a “partidela” terminou com uma merenda composta por produtos regionais.
Este ano, a acção tentou recriar a novela transmontana “Ares da Minha Serra”, da autoria de Campos Monteiro. “A partição da amêndoa, em casa da snr.ª D. Clotilde, começava por alturas das oito horas da noite e terminava infalivelmente às dez e meia (…) Vinham sempre cinco ou seis mulheres à geira para auxiliarem as criadas nessa monótona tarefa. Sentavam-se em círculo no chão, de costas voltadas para os muros e pernas cruzadas à árabe. Diante de cada qual, uma pedra de granito. Na mão direita, uma barrinha de ferro ou aço, a servir de martelo”, refere o autor moncorvense naquela obra.

“Partição” em desuso

Recorde-se que, nos concelhos do Douro Superior, a amêndoa constituiu uma importante fonte de rendimento, desde o séc. XVIII até ao início dos anos 80 do séc. XX. A partir daí, a produção tem vindo a decair, sendo os velhos amendoais substituídos pela vinha, ou, pura e simplesmente abandonados, apesar da ligeira subida do preço da amêndoa, verificada no ano passado.
Atendendo ao declínio do amendoal, a “partidela” caiu em desuso. Nesta operação utilizam-se pequenos ferros para partir a casca lenhosa da amêndoa, a fim de se lhe retirar o grão, “pois os compradores pagavam melhor o miolo da amêndoa já sem a casca”, refere o encarregado do Museu do Ferro, Nelson Campos.
Segundo o responsável “as famílias, os vizinhos e os amigos juntavam-se ao serão e, numa actividade de entre ajuda, iam executando essa tarefa, num ambiente de convívio descontraído, em que participavam novos e velhos”.
Tal como aconteceu no sábado passado, cada sessão terminava com uma merenda oferecida pelo anfitrião para quem se partia. “Os proprietários mais abastados pagavam alguma coisa pelo trabalho (normalmente pagava-se ao alqueire de grão partido), mas entre os pequenos colheiteiros a entre ajuda era a norma”, acrescenta Nelson Campos.

Tentativas de mecanização

De acordo com o encarregado do museu moncorvense, a partir dos anos 70 do séc. XX, houve algumas tentativas de mecanização da “partidela”. “As Cooperativas (e a célebre União Comercial de Moncorvo) introduziram britadeiras mecânicas, que por pouco tempo funcionaram, tendo soçobrado perante a concorrência da amêndoa da Califórnia (EUA) que quase aniquilou a produção algarvia e trasmontana, bem como de alguns países do Sul da Europa”, relembra o arqueólogo.
Sendo assim, a “partidela”, seja tradicional ou mecânica, deixou de se fazer. Por outro lado, “as alterações dos hábitos quotidianos, com o aparecimento das telenovelas, mataram o convívio ao serão, em que tal actividade se processava, entre os meses de Outubro e Dezembro, lamenta o responsável.
No futuro, as “partidelas” deverão recorrer a matéria-prima “da casa”, dado que nos terrenos do Museu do Ferro foram plantadas algumas amendoeiras que já começam a frutificar.