Mogadouro e a esmola presidencial

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Ter, 31/01/2017 - 10:14


Campeão da popularidade, Marcelo não esmorece no seu entusiasmo de bater todos os recordes, mesmo quando vai crescendo o número de cépticos que esperam confirmar, a qualquer momento, o rebentar da bolha da fama presidencial.
O Presidente da República parece querer chamar a si o dom divino da ubiquidade, pelo menos nos espaços da comunicação social, para que o povo permaneça atento, venerador e obrigado por tanta dedicação à estabilidade política e tanta solicitude para participar nas soluções dos problemas que se multiplicam todos os dias.
A generosidade presidencial contemplou, na semana passada, com 25.000 euros, do que sobrou da sua campanha, o agrupamento de escolas de Mogadouro que, nalgumas listas de resultados dos exames nacionais, ficou no último lugar, no que respeita ao ensino secundário. O Presidente terá mesmo anunciado que o dinheiro se destina a um laboratório de física e química.
Aparentemente, tratou-se uma decisão nobre e avisada, por parte do mais alto magistrado. As redes sociais registaram milhões de “likes” embevecidos, acompanhados de prantos sobre a má sorte das gentes daquela terra, por acaso berço de um dos vultos fundamentais da literatura portuguesa, na transição do século XIX para XX, o notável Trindade Coelho, coevo de outro dos maiores, esse de Freixo de Espada à Cinta, Guerra Junqueiro.
Sem enveredar pela discussão da validade dos rankings, lançados sobre o sistema educativo por influência de grupos de pressão ligados ao ensino privado, onde as classificações dos alunos reflectem a selecção que o dinheiro determina, vale a pena reflectir sobre o caso de Mogadouro, porque a realidade pode ser mais complexa do que parece e a generosidade do Presidente pode ser uma precipitada e pouco informada beatitude.
Mogadouro não é, no distrito, o concelho com piores índices sócio-económicos. Pelo contrário, apresenta números que lhe garantem uma quarta ou quinta posição entre os doze municípios.
Assim, seria preciso observar, com profundidade, as razões que fizeram resvalar os resultados do agrupamento de escolas. Por exemplo, perceber se os jovens de Mogadouro estudam, de facto, na vila ou algumas famílias preferem deslocá-los para o Porto ou para Bragança, identificando as razões de tal fenómeno que, a confirmar-se, poderá ajudar a perceber os resultados alcançados.
Então se poderão perspectivar formas de intervenção para recuperar posições que a então escola secundária local detinha durante mais de uma década de exames nacionais do actual modelo, que começou a ser aplicado no ano lectivo de 1993/94.
Se nos ficarmos por actos espectaculares, em vez de intervenções sérias, pode acontecer que, nos próximos tempos, mais escolas do distrito batam no fundo, ao mesmo tempo que jovens daqui oriundos brilharão por esse país fora.

Por Teófilo Vaz