A década fatal

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Ter, 15/01/2019 - 10:02


Há uma semana escreveu-se neste espaço que o Plano de Investimentos até 2030 poderia trazer-nos notícias demolidoras, apesar dos panos quentes em que o poder tem sido pródigo, autênticos emplastros para aliviar a dor, mas avaro em acções necessárias para reverter uma situação que se agrava todos os dias.

Tempos houve em que estivemos pior, décadas a assistir à sangria interminável de gerações, porque nos faltava tudo, uma verdadeira miséria, sem água canalizada, sem electricidade, sem estradas nem telefones, sem escolas, sem médicos, um “cu de Judas” donde se fugia na esperança de voltar quando a equidade e a justiça fossem valores fundamentais do país, que não haveria de estar condenado a ser a caricatura ridícula do desenvolvimento, na expressão bacôca do novo-riquismo, que confunde o progresso com carros da moda e baldes de pipocas.

Alguns ficaram, dispostos a correr o risco de não chegar a conhecer os dias de serenidade que a confiança no futuro permite a alma humana. O alento vinha-lhes de que não há mal que sempre dure e a terra havia de permanecer para além da soberba e da omissão dos protagonistas breves da dança macabra da politiquice.

Em quase meio século de regime dito democrático não se conheceu alívio de injustiças, que continuaram a esvaziar-nos de gente, reduzindo-nos à antecâmara do fim. Somos tentados a questionar-nos sobre as razões porque não lográmos renascer, como se um desígnio fatal nos estivesse reservado. Não nos será fácil assumir que muito do que aconteceu é da nossa responsabilidade, porque não soubemos resistir, deixando-nos levar pelos enganos da grande urbe e demitindo-nos de procurar soluções partilhadas por eleitores e eleitos, nas múltiplas eleições em que fomos chamados a participar.

Aceitámos a representação morna, sem responsabilizar deputados, presidentes de câmara, ou mesmo secretários de Estado e ministros que já tivemos. No fundo, também encarámos as funções a que ascenderam como uma forma de arrumarem as suas vidinhas, nalguns casos transformadas em vidonas, num ambiente de ausência de valores de cidadania que não abonam a nossa dignidade.

Bateram-se palmas aos que, manipulando a nossa tristeza, nos prometeram o mapa e o centro nevrálgico da península, enquanto continuaram a promover investimentos massivos noutros lados, agravando a nossa dependência das suas decisões mortíferas.

O anunciado Plano de Investimentos é o último acto deste verdadeiro crime sem castigo, metódico, talvez perfeito, porque há-de passar à história como uma inevitabilidade, a vida é assim e o que tem que ser tem muita força.

Nas condições actuais, com uma maioria que garantiu ao governo uma legislatura tranquila, faltou a coragem de avançar com uma estratégia para o desenvolvimento do país. É verdade que houve outras maiorias que o puderam fazer e se renderam à cobardia, à cupidez e à insanidade. Esperava-se mais para o país do que simplesmente deixar correr o marfim de um ciclo curto da economia que, em breve, deixará cicatrizes indeléveis na história, mais uma vez risível, deste país.

 

Teófilo Vaz