Prigozhin, o rebelde

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Aparentemente nada de novo na evolução desta guerra insana que Putin desencadeou contra a Ucrânia, colocando a Europa e o Mundo inteiro em pleno alvoroço. Nada de novo, é uma forma de dizer, pois eu já tinha referido, não há muitas semanas, que o que esperava Putin não era mais do que o que aconteceu aos outros ditadores que promoveram guerras e as perderam. O que está a acontecer agora na Rússia, era portanto, esperado mais dia menos dia, ou seja que o povo russo se amotinasse contra o poder ditatorial de Putin e de alguma forma, tentasse mudar o rumo dos acontecimentos. E isso foi acontecendo, um pouco por toda a Rússia, mas sem organização, o que fez com que muitos fossem presos e castigados pelo regime. Era um sinal que Putin deveria ter interpretado positivamente antes que fosse tarde. Por outro lado, a entrada na guerra do amigo Prigozhin, cozinheiro de Putin e agora comandante de uma força militar conhecida como Wagner, veio alterar as coisas. Para o líder russo, Prigozhin seria o testa de ferro que faria vergar a Ucrânia e conquistar posições importantes para o avanço russo. Mas nada é tão certo como o esperado. Desde cedo se percebeu que Prigozhin queria um pouco mais do que o que lhe tinham prometido e fê-lo saber atacando o comando militar russo e o próprio Putin. Tudo se agudizou depois dos combates de Mariupol. O que se passou na conquista desta cidade ucraniana foi um completo holocausto. Uma população de 73.000 habitantes desapareceu. Uma cidade completamente destruída, pejada de milhares de mortos. Prigozhin contribuiu muito para este desfecho. Putin acreditou que o seu amigo lhe daria os louros necessários após várias vitórias. Depois seguiu-se Bakhmut. Outro desastre completo idêntico a Mariupol. Uma cidade desfeita e uma população desaparecida, acompanhada por milhares de mortos, tanto do Grupo Wagner como do exército russo. Prigozhin alertou o comando russo da situação. Não acreditaram. Putin contradizia as comunicações do comandante do grupo Wagner e adiantava outros números favoráveis à Rússia e ao exército russo. Não tardou Prigozhin em desmascarar toda uma situação calamitosa em termos falta de armamento e do número de mortos e do real avanço do exército ucraniano. Putin continuou alheio às reivindicações e aos protestos. A comunidade internacional, limitando-se aos vídeos que eram colocados na Internet pelo Grupo Wagner, não sabia muito bem em quem acreditar. Na dúvida, levava um pouco a sério as afirmações de Prigozhin, mas na esperança de que Moscovo tomasse uma decisão séria sobre o conflito. Putin continuou confiante na sua política de desmilitarização da Ucrânia, sem conseguir informar que afinal a Ucrânia nestes dezasseis meses de guerra, aumentou o seu exército enormemente, que as suas armas e blindados passaram a ser dez vezes mais e que o exército russo, esse sim, se desmilitarizou, perdeu os carros de combate obsoletos que tinha, os tanques e milhares de homens que foram enviados para a frente de batalha como carne para canhão. Isto nunca ele admitiu. Mas a Rússia é enorme. Subitamente, deparou-se com o imprevisto. O seu amigo rebelde, virou-lhe as costas e quase começou uma guerra civil com o objetivo de o tirar do poder. De um dia para o outro tomou a cidade de Rostov, centro nevrálgico do exército no sul da Rússia. Subitamente, mais ou menos consciente da realidade das coisas, Putin não sabe o que fazer, se fugir do país, se reagir arrastando a Rússia para uma guerra civil, também sem sentido, ou pedindo ajuda e conselho aos ainda apoiantes como o Irão, a Bielorrússia ou a Turquia. Putin percebeu as ameaças de Prigozhin de que haverá um novo Presidente na Rússia dentro de pouco tempo e que quer um país sem corrupção, sem mentiras e sem burocracias. Daí ele pedir contenção a ambas as partes. Mas o que irá fazer Putin? É demasiado orgulhoso para se render e para entregar o poder a outro. Foi o Presidente da Bielorrússia que rapidamente serviu de moderador do conflito e negociou com Prigozhin a mando de Moscovo. A Rússia é um país enorme e não é fácil controlá-lo na íntegra e por isso, nem Prigozhin nem outro como ele, serão capazes de o fazer. Putin está bem protegido e tem um exército próprio muito maior do que Prigozhin. Resta saber se a fidelidade continua a ser a mesma! Obrigado a recuar quando avançava para Moscovo, Prigizhin parece ter aceite ir para a Bielorrússia e sair de Rostov. Quem ganhou? Até agora, ninguém, a não ser o próprio povo russo e o seu exército. No meio de tudo isto, a Ucrânia poderá tirar dividendos? Como ficará a guerra? O que poderá fazer Putin? O que se segue? Acredito que a indecisão será enorme. Na Rússia já há abandono em várias cidades incluindo Moscovo. Putin já faz promessas de amnistia aos soldados do grupo Wagner se abandonarem. Que Putin terá de abandonar o poder, mais tarde ou mais cedo, não tenho dúvidas, mas não será facilmente nem tão depressa como o comandante do Grupo Wagner pretendia. Cada dia será uma aposta no escuro. O dia de amanhã poderá ser completamente diferente e os russos acordarem com as armas apontadas à cabeça. Putin dificilmente poderia imaginar tal situação! Moscovo já estava cercada com exército russo com medo do possível avanço de Prigozhin. A fragilidade do regime foi posto à prova. Putin chamou o amigo rebelde para o defender e agora teve de se defender dele. Mas será que as coisas ficarão por aqui? A ver vamos.

Luís Ferreira