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Um coração que não bate. Só apanha

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Nestes dias de chuva, a minha Mãe andava empenhada numa batalha perdida à partida. Lavou o chão da varanda e tinha esperança que este pudesse secar em tempo útil. A água continuava a vir do céu puxada pelo vento e a humidade era palpável no ar. Claro que no azulejo também. Uma guerra entre duas Mães (a minha Mãe e a Mãe Natureza) que tinha já um ganhador desde o início. E, claro está, o chão não secou. A minha Mãe continuou a reclamar, apesar de cada vez menos, à medida que se ia resignando às condições meteorológicas. Contudo, mantinha alguma da esperança inicial, creio. A esperança é uma coisa, ao fim ao cabo, estúpida. Porque nos empresta uma certeza irrealista de que algo pode mudar e conspirar a nosso favor. Por vezes, temos só que nos resignar aos desígnios que as circunstâncias nos oferecem. Nas lides domésticas e no resto da nossa existência. É a esperança que nos coloca perante as piores situações que podemos imaginar. E acho que nem funciona, se não tivermos sorte. A esperança é o que nos faz ir. A sorte é o que nos faz vingar. O tal vento que muda e alinha os astros para nós, para tudo correr de feição. Raramente acontece, além de que nada disto é certo nem tão pouco de crença geral. Há quem siga sem expec- tativas, há quem nem acredite na sorte. Pior ainda: haverá uma franja populacional que é da equipa da frase feita “a sorte constrói-se”. Isto será mentira, na medida em que só podemos controlar aquilo que a nós nos diz respeito e todas as histórias têm, pelo menos, dois lados. E, quase sempre, controlamos muito mal. Às vezes pelas tais circunstâncias. Outras tantas só por falta de capacidade de gestão. Associado a tudo isto há sempre um sentimento de frustração, de tristeza e de angústia. A vida seria mais simples se fosse como nós queremos? Seria. Sem mais comentários. Não acho nada que os obstáculos nos tornem mais fortes ou resilientes. Tornam-nos mais amargos, inflexíveis e cépticos. Dizemos que acreditamos que coisas boas vão chegar só porque é preciso dizer alguma coisa. Para mentirmos a nós próprios e aos outros. As coisas boas que poderão chegar vão trazer novas complicações. O que vale é que a experiência vai acumulando e com isso aumenta também a leitura prévia que somos capazes de fazer para responder à questão: “Como é que será que este novo evento me pode magoar?”. Afinal, e em jeito de resumo, há corações que não são feitos para bater. Estão destinados só a apanhar.

Tânia Rei