Os fogos e a negligência centralista de Lisboa

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No rescaldo de um verão verdadeiramente quente a todos os níveis, terá passado ao lado dos representantes do nosso distrito, talvez demasiado ocupados com as autárquicas, um artigo no Financial Times revelador sobre o actual estado do interior do nosso país. Nesse artigo, esse jornal económico que é dos mais reputados a nível internacional, dedicou um artigo à problemática dos incêndios florestais em Portugal. O artigo, (https://www.ft.com/content/54fa495c-8bdc-11e7-a352-e46f43c5825d), é uma reportagem que integra a voz de autarcas que culpam a "centralização", o "êxodo rural" e o "abandono do interior" pelo drama dos incêndios que Portugal vive, particularmente no caso do grande incêndio de Pedrogão Grande de que matou 64 pessoas este verão. Nesse artigo, entre outras informações, foram dados os exemplos de que para organizar uma competição de Vólei é necessária a autorização do ministério do ambiente de Lisboa. Outro dado menos caricatural é o facto das autarquias locais representarem 14% do orçamento público e terem 17% do emprego público, o que contrasta com a média europeia de 25 e 36%, respectivamente. Infelizmente, esta tragédia voltou a repetir-se, com os mortos a ultrapassarem a centena. Talvez pela tragédia traduzida nestes números e pelo “raspanete” do Presidente Marcelo, o governo fez uma reunião este fim-de-semana onde, aparentemente, e de forma musculada apresentou um conjunto de medidas, ainda assim, muito teóricas, mas que, a realizarem-se, seriam o início de uma pequena revolução para nós residentes e investidores no interior. As tragédias deste verão poderiam ser assim o rastilho do tratamento do maior “tumor” que o nosso pais tem e que é a crónica desigualdade interior/litoral e que tem sido tratado com meia Aspirina, quando necessita uma forte operação de peito aberto. Assim sendo, deveríamos ter na região uma receptividade para esta oportunidade, começando pelos nossos autarcas, mas passando por cada um de nós. E não vejo, no passado recente, um alinhamento que nos seja tão favorável como o que potencialmente temos neste momento. Começando pelo incansável Secretário de Estado Jorge Gomes, pelos novos Presidentes eleitos no distrito, pelos recursos disponibilizados pelo PDR 2020, pelas novas licenças de centrais de biomassa que vão ser lançadas, pelo novo regime de cadastro florestal, etc. A nossa desertificação poderia ser, pela primeira vez, uma enorme vantagem. Poderia dar um exemplo. Na ausência da criação das comissões de compartes, ficaram as Juntas de Freguesia com a gestão das dezenas de milhares de hectares de baldios que o nosso distrito tem. Estas áreas, acrescentadas das ZIF´S e baldios existentes, dos terrenos públicos e privados que pudessem ser anexados, dariam escala a uma ou duas centrais que poderiam produzir significativas quantidades de electricidade e, sobretudo, centenas de postos de trabalho evitando assim os barris de pólvora em que se tornam as nossas florestas nos períodos mais quentes. Para tal seria somente a união dos municípios e dos poderes nacionais para criarem esta nova ordem florestal que desse futuro e sustentabilidade a um projecto que seria, para além da resolução de um problema que são os incêndios, uma oportunidade de desenvolvimento, modernidade e sustentabilidade da nossa região. Para comprovar esta teoria veja-se e compare-se as áreas ardidas genéricas com as áreas ardidas que alguns fundos de investimento florestal têm em sua gestão. A estes factos acrescente-se que, por exemplo, a hora de um helicóptero Kamov custa, segundo o jornal Expesso, 35.000€/hora. Não seria melhor investir parte destes tremendos custos de combate na prevenção e tratamento das nossas florestas? O que se pedia agora é que os nosso autarcas e forças da região pudessem dar as mão e ter uma estratégia conjunta para que pudessem ter uma estratégia global para viabilizar uma intervenção estratégica e de futuro alterando a sua visão da eterna “capelinha” do seu conselho. Porque assim sendo, ganharíamos todos e ganharia Trás-os-Montes.  

Nuno Costa Gomes