Vivências

PUB.

Ter, 10/05/2005 - 16:41


Dia 1 de Maio de 2005 Estive a ouvir na RBA canções de intervenção de Adriano e de Zeca Afonso. A canção do Zeca Afonso que mexeu com os meus sentimentos de saudade e de revolta foi “O soldadinho não volta do outro lado do mar”.

São decorridos 30 anos! Não é o soldadinho que não volta (no meu caso) do outro lado do mar, mas o graduado da PSP Carlos Lopes, falecido em Maio de 1975.
Recebemo-lo num caixão zincado!… A não ser os familiares e amigos, ninguém se preocupou com esta morte que não foi em serviço, mas que foi num clima húmido à beira-mar.
Há 40 anos que cheguei a Moçambique quase com cinco filhos. Ao sair do barco, todo o meu mundo anterior se desmoronou! A saudade do nosso Portugal era imensa. Encontrei tudo tão diferente! Depois, a nostalgia apoderou-se de mim, ao acompanhar aquela imensidão de mato na viagem de mais de 400 km.
Ora, como depois da tempestade vem a bonança, no fim desta viagem tão longa, deparei com a pequena e linda cidade de Inhambane com a sua bela baía e os seus asseados jardins. Foi esta a terra que Vasco da Gama apelidou de “Terra da Boa Gente”.
Aqui nasceram os meus restantes filhos. Vivia-se como em família. O nível de vida era muito bom. A cidade ideal para os meus filhos crescerem e viverem.
Deu-se então o 25 de Abril e com ele a Descolonização. Concordo. Todos os povos têm direito à sua independência, mas não daquele modo! O meu empregado e outras pessoas amigas aconselharam-nos a regressar.
Chegámos no dia 10 de Abril. Acomodámo-nos (no fim de uma semana) numa casa desabitada e sem as condições mínimas. Estávamos a adaptar-nos aos bons ares, aguardando para o fim do ano a chegada do chefe de família.
Eis que no dia 10 de Maio recebemos a fatal notícia da sua morte. Foi uma grande ferida e grande fatalidade. Fiquei viúva com oito filhos, o mais velho de 15 anos e a mais nova de meses.
Concordo, pois, que se façam apelos e exigências para as forças de segurança serem mais consideradas e auferirem de mais direitos! Já lá vai o tempo em que ninguém do Governo se preocupava com situações dramáticas como foi a minha e outras semelhantes!
Há 40 anos que foi a nossa partida para o Paraíso, transformada, no fim de 10 anos, num Inferno! Perda, dor e tristeza! Perguntava a Deus onde Ele estava!…
Contudo, hoje, dou graças a esse Deus. Ultrapassámos essa fase má e, mesmo com as vicissitudes da vida, tanto eu como os meus filhos, conseguimos singrar e vencer!…
Portanto, bendito seja Deus e que rico Dia da Mãe, com os oito filhos a saudarem-me e com as minhas netas para quem, ao Senhor, peço a bênção.

Lagarelhos, 1 de Maio de 2005

Maria Inácia