“A região já tem ensino universitário”

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Ter, 07/06/2005 - 14:53


É fundador do Instituto Piaget Nordeste, em Macedo de Cavaleiros, que dirigiu durante vários anos. Hoje, Armando Queijo continua ligado à instituição, presidindo ao Instituto Superior de Estudos Interculturais e Trandisciplinares de Mirandela.

Nascido em Grijó (Macedo de Cavaleiros) a 26 de Setembro de 1955, é licenciado em Filosofia e prepara a tese de doutoramento em “Violência Escolar - Disciplina e Indisciplina na Escola: Análise do Distrito de Bragança”.

Jornal Nordeste (JN) – Durante quase toda a época de 90 dirigiu o Piaget Nordeste e desenvolveu um trabalho meritório. Fale-nos desse período.
Armando Queijo (AQ) – Antes de ingressar no Piaget, eu leccionava na Escola Secundária de Macedo de Cavaleiros e fui chamado à Câmara Municipal pelo então presidente, António Joaquim Ferreira (mais conhecido por “Pescadinha”) que me propôs o desafio de liderar um projecto de ensino superior em Macedo de Cavaleiros. Confesso que me apanhou completamente de surpresa, porque a ideia que tínhamos do ensino superior, na altura, ainda passava muito pelos grandes centros do litoral. O Politécnico de Bragança ainda estava a dar os primeiros passos e pensávamos que, fora de Bragança, não era muito pensável ter ensino superior. Mas, o presidente garantiu-me que era um projecto para levar a sério e disse-me que via em mim uma pessoa capaz para levar a ideia avante. Aceitei e foi marcada uma reunião com o presidente do Instituto Piaget, Dr. Oliveira e Cruz.

JN – Como foram os primeiros anos do Piaget Nordeste?
AQ – Após a reunião com o Dr. Oliveira e Cruz começamos a pôr a ideia em prática, com muitas críticas à mistura, porque muita gente não acreditava que o ensino superior pudesse vir para Macedo de Cavaleiros. Até havia quem dissesse que “Macedo há-de formar enfermeiros quando as galinhas tiverem dentes”.
O certo é que arrancámos com um único curso e 25 alunos, mas, quando deixei o Piaget Nordeste, a instituição tinha 10 cursos e quase 2 mil alunos que hoje dão uma vida académica e cultural a Macedo muito diferente de há 10 ou 11 anos atrás.

JN – Esteve alguns anos afastado do Instituto Piaget, mas agora regressou. Porquê?
AQ – Vamos primeiro ao interregno, porque explica bem o regresso. É como tudo na vida, porque de vez em quando temos de parar um bocadinho. Foram nove anos muito desgastantes, não pelas críticas que sempre surgem, mas porque começamos o Piaget em Macedo a partir do zero e foi necessário um trabalho muito intenso. Recordo que arrancámos em instalações pré-fabricadas e fomos construindo instalações definitivas e equipamentos ao longo dos anos, fazendo investimentos em Macedo na ordem dos 2,5 milhões de contos, falando ainda em escudos.
Na altura não havia horas de trabalho, não havia fins-de-semana e trabalhava muito à noite, pelo que sacrifiquei muito a minha família. Entendi, por isso, que ao fim de nove anos tinha que parar um pouco, embora continuasse sempre ligado à instituição.
Passados quatro anos de interregno, o Dr. Oliveira e Cruz disse-me que eu tinha de regressar, porque precisava de mim em Angola, mais concretamente na Universidade Jean Piaget. Fiquei completamente desconcertado, porque não tinha qualquer experiência de África e aceitar esse convite implicava mudanças profundas no plano pessoal e familiar. Mesmo assim, acabei por ir para lá, mas ao fim de seis meses tive de regressar por razões de saúde. Foi então que o Dr. Oliveira e Cruz me fez o convite para Mirandela, onde estou actualmente.

JN – Fale-nos um pouco do Instituto Superior de Estudos Interculturais e Transdisciplinares de Mirandela.
AQ – Gosto de salientar isto, porque às vezes falámos muito de universidade e ensino universitário no distrito de Bragança e esquecemo-nos que o Instituto Piaget de Mirandela é um estabelecimento de ensino universitário. Não só lecciona licenciaturas, como é capaz de dar formação ao nível de mestrados. Digo isto porque Bragança aspira, há muito tempo e legitimamente, pela criação duma Universidade, com a qual concordo, digo desde já.
Quando cheguei a Mirandela, há cerca de dois anos e meio, deparei com uma instituição com duas licenciaturas. Uma em Engenharia Civil e outra em Engenharia Alimentar. Depressa percebi que não era viável um projecto de ensino universitário com apenas dois cursos, pelo que tínhamos, rapidamente, de aumentar o leque de ofertas para conseguir atrair jovens da região e de outras zonas do País. Fez-se, então, um estudo de mercado para saber quais as licenciaturas que melhor se encaixavam na região e cheguei à conclusão que, para além da área tecnológica, tínhamos de entrar na área das Ciências Sociais e Humanas e na área das Artes. Foi assim que surgiram alguns projectos de novas licenciaturas como Música, Motricidade Humana, Sociologia e Ciências da Comunicação. Estão a correr mais ou menos bem, porque esta estratégia de diversificação e de aumento das licenciaturas está a dar os seus frutos.

JN – De que modo os cursos ministrados em Mirandela podem beneficiar as empresas da região?
AQ - De facto, uma instituição de ensino universitário não se pode limitar a ministrar licenciaturas. Tem de investigar e colocar essa investigação ao serviço das empresas. No campus de Mirandela produzimos investigação e colocamos esse trabalho ao serviço do tecido empresarial. Foi assim que criamos o Gabinete de Apoio à Industria Agro-Alimentar que realiza variadíssimas análises a produtos tradicionais de empresas da região. Evita-se, assim, que essas empresas tenham que se deslocar a laboratórios da zona do Porto.
Esta vertente da prestação de serviços à comunidade tem muito significado para nós. Na área da Engenharia Civil estamos a elaborar um protocolo com as Câmaras de Mirandela e de Macedo de Cavaleiros, tendo em vista a realização de estudos sobre qualidade e abastecimento de água às populações, que contempla mecanismos para evitar fugas nas condutas, numa altura em que este bem é cada vez mais precioso.

Entrevista de Marcolino Cepeda, Rui Mouta e Mara Cepeda