Quando os animais “imitam” a gente

PUB.

Ter, 27/09/2005 - 17:13


Mais um livro de Literatura infanto-juvenil de Alexandre Parafita, com a chancela da editora Âmbar. A obra tem por título “Contos de animais com manhas de gente”, e é enriquecida com as ilustrações de Eunice Rosado.

Trata-se de mais uma excelente proposta deste autor transmontano que já publicou mais de três dezenas de títulos (desde a poesia, ao ensaismo e à literatura infantil) e que, nos últimos anos, brindou as crianças de todo o País com livros de grande impacto e reconhecida qualidade, tais como: “O conselheiro do rei”, “A mala vazia”, “Diabos, diabritos e outros mafarricos”, “Bruxas, feiticeiras e suas maroteiras”, “Histórias de arte e manhas”, entre outros.
Este impacto e esta qualidade estiveram bem patentes, recentemente, quando um programa televisivo escolheu o livro “Histórias de arte e manhas” e a experiência do seu autor como pretexto para um interessante documentário sobre a literatura infantil em Portugal.
Quanto à obra agora publicada, mais uma vez o escritor reconta e recria os contos da tradição oral transmontana de forma brilhante: com estilo, jogos de rimas e muito humor. Foi buscá-los a Vinhais, Sabrosa, Carrazeda de Ansiães, Macedo de Cavaleiros, Montalegre e Vila Real, “desenterrando-os” da memória de vários informantes também identificados (e homenageados) no livro. Aliás, na contracapa pode ler-se: “As histórias deste livro fazem parte da tradição oral. Por isso, voaram no tempo, de geração em geração, nas asas da memória dos seus narradores. Ao recriá-las para o livro, quis o escritor que outras asas as levassem mais longe. São histórias de animais que falam de gente: dos seus vícios, virtudes, diabruras. Com graça e humor, com ironia e astúcia, dizem verdades a brincar e a rir. São histórias e verdades do povo. São histórias e verdades de sempre.”
Depois, abre-se o livro e as histórias correm nas páginas com uma coerência notável. Algumas parecem cantar, tal o jeito narrativo do autor. O próprio título de cada uma delas não podia ser mais sugestivo: “O lobo, a velha e a cabaça”; “O lobo, a raposa e o ouriço”; “O afilhado do lobo”; De pele alheia, grande correia”; “A raposa e o sardinheiro”; “Os cinco amigos e os ladrões”; “A raposa, o galo e o Solidó”; “Por bem fazer, mal haver”.
Todos os animais, especialmente o lobo, a raposa, o ouriço-cacheiro, o galo, o burro e o leão, aparecem carregados de simbolismo nestas histórias, cruzando-se neles os traços temperamentais dos seres humanos. E como não podia deixar de ser, os mais comuns são o lobo e a raposa. O primeiro selvagem, parvo e estúpido; a segunda manhosa, oportunista e traiçoeira.
Não menos interessante neste livro (especialmente para professores e educadores) é ainda a rubrica final, onde o autor explica de forma muito sintética e clara: o que são e como são os contos populares, para que servem, que géneros de contos existem, etc.
Por tudo isto, “Contos de animais com manhas de gente” é um livro cómico, brincalhão, agradável e útil para todos. E não apenas para as crianças.

Armindo Mesquita
Doutor em Literatura; Professor da UTAD