À procura da Literatura Portuguesa

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Ter, 03/05/2005 - 17:48


Nasceu na Torre D. Chama em 1956. É professor de Cultura e Literatura Portuguesa na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, onde se licenciou em Filologia Românica.

Doutorou-se em Letras, em 1996, com a tese “Mágico Folhetim: Literatura e Jornalismo em Portugal”. Foi Leitor de Português na Universidade de Budapeste e é tradutor de obras literárias húngaras, tendo sido condecorado duas vezes pelo Estado da Hungria.
Tem vasta obra publicada e pretende dedicar-se, cada vez mais, à escrita.

Jornal NORDESTE (JN) – Quando veio para Bragança, logo se integrou no meio cultural de então. Como era ser estudante nessa altura?
Ernesto Rodrigues (ER) – Não era nada fácil. Eu vivia uma faceta da oposição política antes do 25 de Abril. Tínhamos um grupo no Lar da Gulbenkian e vivíamos mais à noite, sonhando com o futuro de um País livre. Enfrentávamos as reticências de professores, do presidente da Câmara e, até, do governador civil, mas conseguíamos conciliar esses ideais de liberdade com os estudos e lá íamos cumprindo os mínimos no Liceu.

JN – A sua vida profissional está intimamente ligada ao ensino, mas também ao jornalismo.
ER – No início queria ir para Coimbra, levado, sobretudo, pela leitura de Trindade Coelho e das suas vivências nessa cidade. Mas, de facto, eu queria fazer jornalismo e, para isso, tinha que ir para Lisboa. A partir do terceiro ano da Faculdade comecei a estagiar no Correio da Manhã, em 1979, e no Portugal Hoje. Na altura não dava nada pelo Correio da Manhã, que hoje está aí em grande, ao passo que o Portugal Hoje acabou ao fim de dois ou três anos.
Sou, subsidiariamente, professor e continuo a colaborar com a Imprensa, mas aquilo que sempre quis, desde criança, foi a escrita e gostava de ficar escritor sem mais.

JN – Foi docente na Escola Superior de Educação de Bragança durante dois anos. “Santos da casa não fazem milagres” ou esta cidade é pequena demais para as suas ambições profissionais?
ER – Por um lado é pequena, mas se as minhas ambições se ficam pelo direito de passar o máximo de tempo possível em casa, em Bragança também poderia fazê-lo. O que quero fazer, de facto, é escrever. Acontece que, na altura, eu vinha com a família e não tinha hipótese de acrescentar ao vencimento o que posso acrescentar em Lisboa. Cheguei aqui em 1986, tinha já uma segunda filha a nascer, a minha mulher estava longe da grande capital a que estava habituada e, apesar do bom acolhimento no Politécnico, não tinha as possibilidades que Lisboa me dava. Aí podia voltar às colaborações jornalísticas que tinha efectuado.

JN – Tem também uma vasta colaboração na Imprensa Regional, nomeadamente na revista Amigos de Bragança, na altura sob a direcção do Dr. Eduardo Carvalho? Vale a pena apostar na Imprensa Local?
ER – Claro que vale. Os Amigos de Bragança foi uma experiência que começou em 1984, mais pelo Dr. Eduardo Carvalho, que precisava de alguém a seu lado. Depois veio o Notícias do Interior, de 90 a 93, uma experiência que se queria mais larga, mas que, a partir do terceiro número, começou a virar para o PS, dada a saída de diversos colaboradores por diferendos partidários. Perdeu-se a oportunidade de fazer uma publicação mais alargada, abrangendo todos os quadrantes.
No que toca à Imprensa Regional, acho que há demasiados títulos em Bragança e que não se perdia nada se as pessoas pensassem em concentrar esforços.
A sensação que me fica é que a Imprensa Regional tem vindo a conquistar a qualidade que não tinha há 30 anos, mas tem-se perdido na dissipação de títulos. Talvez fosse de reduzir o número de jornais para promover melhor esse produto que é a informação regional, que tem de vingar.

JN – Mantém, também, uma colaboração no semanário Expresso. O que pensa do jornalismo que se faz nos dias de hoje?
ER – Penso que se evoluiu imenso. O jornalismo está de boa saúde, embora as condições financeiras não sejam as melhores em alguns órgãos de comunicação social.
Acho, no entanto, que faltam as figuras dos grandes escritores como colaboradores na Imprensa de hoje.

JN – Sei que é um Nordestino atento. Acha que Bragança está no bom caminho em termos culturais?
ER- Creio que sim. Em Outubro estive no lançamento de uma obra literária que decorreu no Teatro Municipal de Bragança e fiquei deslumbrado. Entretanto vejo novos equipamentos, como a Biblioteca Municipal. Foi um salto tremendo em relação aos anos 70, em que tínhamos todos muita criatividade, mas não tínhamos onde expô-la ou apresentá-la. Hoje venham os criadores, porque espaços já não faltam.

JN – Por esse País fora encontram-se transmontanos de grande valor. Temos capacidade para reconhecer o seu trabalho ou andamos centrados no nosso metro quadrado de vida?
ER – Acho que ainda andamos. O Prof. Adriano Moreira dizia à Edite Estrela que, quando estamos com outras pessoas, nunca dizemos que somos transmontanos para que elas não se sintam humilhadas. Isso evidencia uma certa vaidade e ser transmontano passa por ter um grande mérito.
Acho que, em determinadas questões, bastaria uma certa reunião de vontades para ultrapassarmos alguns problemas que afectam a região.

JN- Que futuro podemos esperar para Trás-os-Montes e Alto Douro?
ER- Não vejo grande futuro quando assistimos à desertificação galopante. Os políticos têm de pensar em estancar esta sangria. Sem gente não há região e somos facilmente comprados, como está a acontecer no Alentejo. Devemos sempre acreditar, mas parece-me que, qualquer dia, é só Bragança e o resto é deserto puro.

Entrevista de Marcolino Cepeda, Rui Mouta e Mara Cepeda